Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor:
Em data do primeiro do corrente participei a Vossa Excelência a comunicação que se me havia feito, por parte do General em Chefe do Exército inglês, do Armistício ajustado entre o dito Exército e o francês, assim como dos passos que havia dado para obstar, quanto podia, a que dele resultassem os funestos efeitos que receava, e sobretudo a que faltassem à contemplação devido ao Governo [do Porto] e a este Exército; tendo porém sempre em vista conservar a boa harmonia que as nossas circunstâncias e o interesse pela causa comum pedem que tenhamos com estes aliados. Pelo modo por que o General em Chefe tratou o Major Aires Pinto de Sousa, e pelas explicações que teve com ele, e pelo que se espalhou aqui durante alguns dias, julguei que se romperia o dito Armistício, e que prosseguiriam as operações, e foi por este caso mesmo que, de acordo com o dito General em Chefe, eu marchei para aqui no dia 29 de Agosto, e que se expediram as ordens para que o Brigadeiro Bacelar, que já se achava em Santarém, se adiantasse para as vilas de Ribatejo, como será constante a Vossa Excelência pelas cópias n.º 1. Ontem recebi pelo Major Aires Pinto de Sousa a participação que consta das cópias n.º 2, assim como do ofício que o mesmo Major dirigiu ao General em Chefe, n.º 3. E tendo-se-me pedido que me demorasse aqui no dia 31 de Agosto, e insinuado que a Brigada alemã obraria de acordo comigo, recebeu ordem esta Brigada para passar a Mafra, entretanto que não recebi comunicação alguma que me instruísse acerca do meu destino, nem mesmo recebesse ainda cópia da dita Convenção, nestas circunstâncias julguei do meu dever convocar os Oficiais Superiores deste Exército para os consultar sobre as medidas que parecia conveniente adoptar para conservar a Dignidade Nacional, comprometida sensivelmente por este procedimento. O resultado deste Conselho é o que tenho a honra de levar à presença de Vossa Excelência, rogando-lhe [que] queira pôr tudo na presença da Junta Suprema do Governo [do Porto], a fim de que me possam determinar o que deverei obrar nos diferentes casos que se podem oferecer em tão delicadas circunstâncias:
1.º Se o General inglês não responder às explicações que se lhe pedem, que deveremos nós fazer?
2.º Se o General inglês (o que não é natural) se prestar a não embaraçar as nossas operações separadas, se com efeito as devemos empreender?
3.º Se o General inglês quiser (como é natural) sustentar a Capitulação, e opor-se às nossas operações, que devemos nós fazer?
4.º Se os corpos do Alentejo continuarem a obrar apesar da Capitulação, se devemos nós em todo o caso obrar com eles?
Juntamente tenho de remeter a Vossa Excelência a carta inclusa que o mesmo General em Chefe inglês dirige a Vossa Excelência, e que talvez, aclarando mais as circunstâncias particulares deste negócio, possam facilitar a decisão da Junta Suprema, que solicito com a brevidade indispensável.
Quartel-General da Encarnação, 2 de Setembro de 1808.
Bernardim Freire de Andrada [sic].
[Fonte: Luís Henrique Pacheco Simões (org.), "Serie chronologica da correspondencia diplomatica militar mais importante do General Bernardim Freire de Andrade, Commandante em Chefe do Exercito Portuguez destinado ao resgate de Lisboa com a Junta Provisional do Governo Supremo estabelecido na cidade do Porto e o Quartel General do Exercito Auxiliar de S. Magestade Britanica em Portugal", in Boletim do Arquivo Histórico Militar - Vol. II, 1931, pp. 3-77, p. 22-23 (incluída no doc. 69)].