sexta-feira, 20 de maio de 2011

Carta do Comandante General da província espanhola da Extremadura ao General Kellermann (20 de Maio de 1808)



Ex.mo Senhor:


Nesta manhã apresentou-se mr. Drouet, Capitão Comandante de Engenheiros nesta Praça, o qual foi por mim recebido e acolhido com a mesma consideração e atenção que a todos os demais oficiais franceses que aqui chegaram, tendo-lhe merecido a honra de ter aceite o convite para me acompanhar a almoçar, sem que me tenha manifestado ter-lhe causado o menor incómodo a sua entrada e permanência nesta Praça. Despedimo-nos depois das cinco da tarde na melhor amizade, e saindo mr. Drouet pela Puerta del Puente de Palmas, repararam os guardas que custodiam as rendas, e que estão sempre postados naquele ponto, que mr. Drouet se tinha dirigido à ponte de S. Cristóbal e que andava fazendo algumas observações. Deram parte disto ao Oficial da Guarda e este destacou um soldado ignorante para que o fizesse retroceder e o apresentasse na minha casa, donde havia poucos minutos que eu tinha saído para cumprir os meus deveres de Governador e Corregedor. Logo que me dei conta, e para dar a V.Ex.ª e a mr. Drouet uma satisfação, mandei arrestar o Oficial e pôr o soldado num calabouço, que são precisamente do 2.º Batalhão de tropas ligeiras da Catalunha, que chegaram à há três dias para a Guarnição e hoje foi o primeiro dia que deram serviço de Praça. Em seguida, e apesar dos incómodos do momento, pois estava chovendo fortemente, acompanhei mr. Drouet até deixá-lo fora das portas, por ter insistido em querer pôr-se em marcha.
Ex.mo Senhor, espero que este imprevisto e desagradável caso, que me foi sensível, não seja um motivo para se transtornar a boa harmonia que quero que reine entre V.Ex.ª e eu, entre a Guarnição e os habitantes de Elvas e Badajoz, e finalmente entre as nossas respectivas nações; e que, assegurado V.Ex.ª dos meus inalteráveis desejos de agradar-lhe, sobre os quais lhe informará o portador desta carta, meu Ajudante o Capitão D. Jaime Prat, me proporcione repetidas e muitas ocasiões para acreditá-lo, pois sempre hei de ser e tenho a honra de me confessar o mais atento apaixonado servidor de V.Ex.ª.
Badajoz, 20 de Maio de 1808.

O Conde de la Torre del Fresno

[Fonte: Correspondencia del Comandante General de Extremadura, sobre la entrada de tropas españolas en Portugal a finales d e 1807, la llegada del Ejército francés a la región, su aprovisionamiento y colaboración con él de las autoridades españolas de Extremadura a comienzos de la guerra, in Archivo Histórico Nacional de España, ES.28079.AHN/5.1.145.4.1.1.57.2//DIVERSOS-COLECCIONES,136,N.31]. 





Pastoral do Arcebispo do Évora (20 de Maio de 1808)













Nota: 

Tal como a pastoral do Bispo do Algarve datada de 21 de Maio de 1808, parece que esta pastoral do Arcebispo de Évora, Frei Manuel do Cenáculo Villas-Boasfoi composta devido à pressão do Governo de Junot, na sequência da publicação da carta da chamada deputação portuguesa. Segundo as próprias palavras de Cenáculo, "preparei [...] uma Pastoral que fiz imprimir, [...] a qual cuidadosissimamente não publiquei, sem embargo dos exemplos de muitos outros Prelados que as publicaram, ainda que eu me visse instado e como [que] obrigado a fazê-lo pela insinuação expressa do chamado Secretário de Estado do Interior, Francisco António Herman [sic], em aviso seu e em nome do intruso Junot, datado de 13 de Maio de 1808".
De acordo com uma nota manuscrita apensa ao raríssimo exemplar impresso acima publicado, da autoria de Joaquim Heliodoro da Cunha Rivara, antigo director da Biblioteca Pública de Évora (fundada pelo próprio Cenáculo), os 500 exemplares impressos ficaram assim conservados fechados e empacotados até à expulsão definitiva dos franceses, quando Cenáculo decidiu mandar queimá-los. 
Ainda segundo Cunha Rivara, para além do exemplar acima publicado, que se encontra compilado no 5.º códice (fls. 101-105v) do chamado Diário manuscrito de Frei Manuel do Cenáculo Villas-Boas (disponível para consulta on-line na Biblioteca Digital do Alentejo), somente escaparam às chamas outros dois exemplares impressos: um que Cenáculo enviou ao Príncipe Regente, em anexo a uma relação acerca da brutal repressão dos franceses sobre Évora no final de Julho de 1808, que teremos ocasião de publicar mais adiante (e da qual extraímos o excerto acima citado); e um "que o Padre José Agostinho de Macedo pôde subtrair da tipografia". 


Notícias publicadas na Gazeta de Lisboa (20 de Maio de 1808)


Por notícias de Bordéus consta que a deputação portuguesa tinha chegado àquela cidade, aonde devia residir por algum tempo para esperar as ordens de Sua Majestade o Imperador e Rei.

Entre Madrid e Lisboa continuam a ser livres e frequentes as comunicações; e sem dificuldade chegam os correios: o que anuncia que o interior da Espanha está agora tão tranquilo e tão submisso como a própria vila de Madrid.

As peças seguintes que recebemos daquela capital anunciam que os efeitos da revolução de Aranjuez ficam anulados; que El-Rei Carlos IV tornou a subir ao Trono; e dão a conhecer o modo actual de organização do Governo espanhol.

[seguiam-se, entre outros textos, um manifesto de Carlos IV (4 de Maio), uma carta de Carlos IV a Murat e um decreto do mesmo monarca à Junta de Governo de Madrid (4 de Maio), e uma carta de D. Fernando a seu tio o Infante D. António (6 de Maio)]

[Fonte: 1.º Supplemento à Gazeta de Lisboa, n.º 20, 20 de Maio de 1808].

Notícia publicada na Gazeta de Lisboa sobre a homenagem que vários ilustres portugueses deram a Junot no dia 17 de Maio, depois da recepção em Lisboa da carta da Deputação portuguesa em Bayone, de 27 de Abril (20 de Maio de 1808)


Lisboa, 20 de Maio.


O dia 17 do corrente [mês] será memorável para este país e entrará no número das suas memórias históricas as mais honoríficas. O entusiasmo que se manifestara entre os habitantes da capital e das províncias, ao anúncio das disposições tão benévolas de Sua Majestade o Imperador e Rei para com Portugal, parece ser ainda mais vivo nos corpos do Estado; porquanto todos conheceram que era preciso renovar, nesta circunstância venturosa, a sua admiração ao grande Monarca, a quem assim os Reis como os Povos consideram hoje como seu árbitro e regulador dos seus destinos.
Conseguintemente, os principais corpos do reino pediram ao Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Duque de Abrantes, General em Chefe do Exército, permissão para irem render-lhe a homenagem do seu reconhecimento para com o Imperador, rogando a Sua Excelência que quisesse ser o veículo por onde transmitissem os seus votos a Sua Majestade Imperial e Real.
Sua Excelência, rodeado dos membros do Conselho do Governo e do seu Estado-Maior, recebeu, naquele dia, à uma hora da tarde, não deputações dos ditos corpos, mas sim os próprios corpos, que desejavam apresentar-se todos juntos no seu Palácio.
Havendo os ditos corpos, em trajo de cerimónia e com as suas insígnias distintivas, tido a honra de ser introduzidos ante Sua Excelência, o Excelentíssimo Principal Miranda, Deão da Santa Igreja Patriarcal, foi o primeiro que falou em nome do Clero, e disse* que sendo um dos deveres mais santos imposto pela Religião a submissão aos Soberanos da terra, era para o Clero de Portugal uma bem grata satisfação o ver a sorte deste Reino nas mãos dum Monarca que entre os seus numerosos títulos de glória tem o de Restaurador da Religião Católica em França, e de seu Protector nos países onde faz chegar sucessivamente as suas armas triunfantesSabemos, acrescentou ele, que, pois que Napoleão o Grande destina um Rei para Portugal, esse Rei manterá neste país a antiga pureza da fé e os princípios religiosos, pelos quais a nossa nação se tem distinguido sempre entre os fiéis.

O Excelentíssimo Conde da Ega, em nome da Nobreza, falou nos termos seguintes:
A maior parte da Nobreza que tem hoje, Senhor, a honra de vir em corpo à presença de Vossa Excelência, havendo-me conferindo a distinção de ser o intérprete dos sentimentos e dos votos que desejam manifestar ao representante do maior dos Soberanos, procurarei tanto quanto possa exprimir o reconhecimento que nos tem suscitado a comunicação que por Vossa Excelência nos foi transmitida da certeza da benevolência de Sua Majestade Imperial e Real para com esta nação, e das benéficas intenções com que prepara a nossa felicidade; e achando-nos na justa convicção de haver sido Vossa Excelência a quem devemos as esperanças lisonjeiras que nos enchem do maior prazer, tem Vossa Excelência o primeiro direito a receber deste corpo os mais sinceros agradecimentos por um benefício sem igual.
Uma parte deste mesmo corpo, a deputação portuguesa que teve a honra de chegar junto do Augusto Trono de Napoleão o Grande, possuída da voz unânime de uma nação que há quase sete séculos tem entre as da Europa ocupado um lugar assaz distinto, levando o seu nome às regiões remotas, aonde até o presente conserva o direito de possessões ricas, que descobriu pela animosidade e ciência dos seus passados, e sustentou com o seu braço e à custa do seu sangue; quando esta nação consegue a promessa augusta de não ser confundida com aquela cuja posição se aproxima de nós, e da qual soube separar-se e sustentar a dinastia que então confirmou sobre o seu trono e de que hoje lastima ver abandonados vassalos fiéis que seguiam constantes as disposições de seus maiores. A Nobreza de Portugal vai com o resto da nação acolher-se debaixo da protecção do Árbitro da Europa, do ditador**; e a grandes gritos arrancados do fundo da sua alma, aclamam por seu Protector Soberano a Napoleão o Grande: vemos desde agora raiar os nossos dias felizes; esta Nação receber[á] os benefícios de que se tem feito digna, e desvanecer-se[-ão], à proporção que as circunstâncias o permitem, os males que nestes últimos tempos temos experimentado.
Confiados pois no Génio poderoso e regenerador do maior dos Soberanos, que jamais teve outro que o igualasse e que nos oferece tão generosamente a sua augusta protecção e benevolência; se nos for permitido, e Vossa Excelência assim o dispuser e ordenar, teremos a honra de dirigir por Vossa Excelência estes mesmos votos sinceros e puros à presença de Sua Majestade Imperial e Real num acto que firmemos com as nossas assinaturas: este meio será um testemunho irrevogável da nossa deliberação, livre e espontânea, e nela a primeira base de uma grande Monarquia regenerada, que sendo firmada pela mão augusta do Grande Napoleão, veremos conservada, e só por este único modo sustentada a constituição que no princípio desta Monarquia formalizaram [os] nossos maiores, e que elevando à dignidade de Rei a um Príncipe, filho de outro, francês de origem, o Conde D. Henrique, tivemos a felicidade de que esta dinastia nos desse até o último Henrique uma série de 18 Reis todos dignos, por diversos títulos, de ocupar o trono para que haviam nascido.
Digne-se pois Vossa Excelência continuar na presença augusta do nosso Soberano aqueles bons ofícios com que dispôs o seu benéfico e grande ânimo a considerar esta nação digna de ser acolhida debaixo da sua poderosa protecção; sendo pois Vossa Excelência a quem a Nobreza de Portugal reconhece ser o instrumento do prazer com que vem patentear os sinceros sentimentos da sua gratidão: haja Vossa Excelência por benefício de uma nação que assim como lhe deve o sossego público, que tem sabido pelas suas luzes manter, sem opressão nem violência, estudando o carácter português que muito bem conhece, igualmente como primeiro entre os grandes titulares deste Reino pela graça e dignidade que lhe foi conferida de Duque de Abrantes, à testa desta Nobreza, unindo-se a nós, querer que vamos juntos aos pés do Trono Augusto de Napoleão, e peçamos-lhe que nos confira aquela distinção que recebe o seu Reino de Itália: o seu poder não encontra obstáculos, nem a distância o faz ser menos activo; o seu génio não tem limites; sejamos pois com a França, e do modo que Sua Majestade Imperial e Real o decidir, uma mesma família; são idênticos os nossos interesses, sejam os mesmos os princípios que nos liguem e unam: faça Vossa Excelência conhecer que a Nobreza de Portugal há de conservar constante aquela fidelidade para com os seus Príncipes que sempre distinguiu; que há de sustentar, como sempre o fez, no Campo [de guerra] e nos Gabinetes, a dignidade dos seus Soberanos; que há de seguir com igual adesão o sistema que Sua Majestade Imperial e Real lhe prescrever, pois está convencida de que só assim se fará merecedora da grande felicidade de entrar no número dos fiéis vassalos de Napoleão, ou como seu Soberano imediato, ou como Protector de uma nação federativa que jamais se há de separar das suas augustas intenções.

Ao orador da nobreza sucedeu o Desembargador João José de Faria Abreu Guião, primeiro deputado do Senado de Lisboa, e que faz as vezes de presidente, o qual se exprimiu desta sorte:
Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor, o Senado da Câmara de Lisboa, na parte em que representa os seus concidadãos, e o Juiz do Povo, na que diz respeito aos Grémios dos ofícios a que preside, vêm testemunhar a Vossa Excelência que a fidelidade e respeito aos Soberanos foram sempre as qualidades mais características que enobreceram os portugueses: lisonjeados deste carácter, e de que Vossa Excelência o tenha conhecido, vêm gostosos agradecer a Vossa Excelência o resultado das benéficas intenções de que Vossa Excelência fez nascer no magnânimo coração de Sua Majestade Imperial e Real, que vêm transmitidas no anúncio da deputação de Portugal, que, em consequência das ordens de Vossa Excelência nos foram comunicadas; e não havendo ninguém que com mais energia, consideração e piedade possa de novo levar ao coração de Sua Majestade Imperial e Real as puras, respeitosas e necessárias intenções dos portugueses do que Vossa Excelência por que as conhece, auxilia e protege, animados deste poderoso socorro nos esperançamos de que Sua Majestade Imperial e Real, que do seu respeitoso Trono conhece o estado da Europa, e quanto a nossa situação precisa que as reja com sabedoria, proteja a Religião, faça reinar a Justiça, respeitar as Leis, animar as Artes e as Ciências, procure a abundância e conserve a paz. O mesmo Senhor seja quem faça esta escolha, que só nos pode ser vantajosa sendo regulada pelos heróicos sentimentos de um Monarca tão iluminado, tão generoso e pio como Sua Majestade Imperial e Real, de quem pende a conservação da energia portuguesa.

O Desembargador do Paço Manuel Nicolau Esteves Negrão, Chanceler-mor do Reino, nomeado para falar em nome da Magistratura, disse:
Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor, a carta dos membros da deputação portuguesa enviada junto a Sua Majestade o Imperador dos franceses, Rei de Itália, Protector da Confederação do Reno, aos seus compatriotas, a qual Vossa Excelência mandou publicar, enche da maior satisfação e tranquilidade a todo este Reino; ela contém e descobre um inexaurível, precioso tesouro de graças que a poderosa mão de Sua Majestade Imperial e Real derrama, e continuamente há de derramar sobre este país.
O voto uniforme dos portugueses, de reconhecimento, gratidão, respeito e obediência a tão grande Monarca, assim o assegura: e por sua Real vigilência e sabedoria, esperam os portugueses, com confiança, unir-se ao grande Sistema Continental.
A Mesa do Desembargo do Paço, com todo o corpo da Magistratura, a quem Vossa Excelência, anuindo aos seus desejos, benignamente concedeu esta audiência, vem comigo protestar [=declarar] os mesmos sinceros votos da nação; e o mais exacto cumprimento às Reais ordens de Napoleão o Grande, segundo as quais Vossa Excelência cada dia, com interesse público, tão sabiamente decreta.
A Vossa Excelência, Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor, particularmente rendemos o nosso mais puro agradecimento pela grande influência que terá tido nestes benefícios, pelas informações que terá dado a nosso respeito; e desejando os tribunais fazerem chegar à sua presença por mão do Ministro do Interior [Hermann].

O Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Duque de Abrantes, depois de ter acolhido estes diversos discursos com a afabilidade que o caracteriza, respondeu nestes termos às deputações reunidas na sua presença***:

Senhores, tenho ouvido com verdadeiro prazer os votos que se me acabam de expressar da parte de todas as classes do Reino relativamente à importante questão indicada na memória dos senhores da deputação portuguesa aos seus concidadãos. A unanimidade que reina nos vossos votos é um presságio certo de que sabereis unir-vos para sustentar os direitos do Príncipe que o Grande Napoleão designar para vos reger.
Sustido pela protecção daquele grande Monarca, o Rei de Portugal tornará a pôr esta nação na ordem a que pelas conquistas a elevaram os Vascos da Gama e os Joões de Castro, e pela política os Luíses da Cunha e o ilustre Pombal.
Senhores, de boa vontade me incombirei de transmitir ao Imperador e Rei, nosso Soberano, a representação que deveis fazer em nome de todas as classes reunidas do Reino. Dir-lhe-eis que os portugueses têm merecido a sua protecção pelo muito que nele confiam e pela submissão com que obedecem a todas as ordens que têm emanado da sua vontade imperial. Dir-lhe-eis que nas crises que acabam de suceder, perto de nós, têm os portugueses mantido uma tranquilidade perfeita, e que esta só podia proceder duma tal confiança.
Convido-vos pois, Senhores do Clero, Senhores do Tribunal do Desembargo do Paço, Senhores do Senado da Câmara de Lisboa, a que vos unais com os Senhores da Junta dos Três Estados a fim de coordenar a representação que deve exprimir o voto de todas as classes de cidadãos. Este voto será, como me persuado, digno da nação, digno da grandeza de alma do Monarca a quem a haveis de dirigir. Posto entre ele e vós, bem grato me será pensar que haverá podido contribuir para a vossa felicidade, dando a conhecer ao Grande Napoleão que os portugueses merecem a sua bondade, e são dignos da poderosa protecção e da aliança da grande nação.


Este discurso, pronunciado num tom tão firme como nobre, numa assembleia de 300 para 400 pessoas, escolhidas entre o que há de mais ilustre neste Reino, não produziu aumento algum na afeição que os portugueses professam a Sua Excelência o General em Chefe; acabou porém de electrizar os corações e os ânimos, mostrando aberto aos olhos da nossa nação um futuro brilhante. O Duque de Abrantes, decorrendo consecutivamente entre esta numerosa e respeitável reunião de pessoas, parecia um pai em meio duma família a quem acabava de prometer uma grande felicidade. Todo aquele luzidio concurso se retirou convencido de que as nossas esperanças se hão de realizar, pois que têm de chegar aos pés do trono de Sua Majestade o Imperador e Rei, apadrinhados pelos sufrágios daquele que, nos campos da vitória como bem na carreira política e no Governo da capital da Europa, sempre soube tão bem servir a tão grande Amo; e justificar a mais alta confiança que lhe tem merecido.

[Fonte: 1.º Supplemento à Gazeta de Lisboa, n.º 20, 20 de Maio de 1808].

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Notas:

* Deve aqui expor-se a seguinte nota, publicada na Gazeta de Lisboa, n.º 35, de 1 de Outubro de 1808 (ou seja, já depois da expulsão dos franceses):




** Deve notar-se que o termo «ditador» não tinha, na época, a conotação autoritária e despótica normalmente atribuída nos nossos dias, significando antes o "magistrado extraordinário entre os Romanos, revestido do supremo poder". Cf. Novo Diccionario da Lingua Portugueza: composto sobre os que até o presente se tem dado ao prelo, e accrescentado de varios vocabulos extrahidos dos classicos antigos, e dos modernos de melhor nota, que se achaõ universalmente recebidos, Lisboa, Typografia Rollandiana, 1806.



*** A Gazeta de Lisboa inseria também o discurso original em francês. Só copiámos a tradução portuguesa.