quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Bases para o restabelecimento do Governo da Regência, enviadas pela Junta do Porto ao Almirante Charles Cotton (4 de Agosto de 1808)



Em nome do Príncipe Regente Nosso Senhor. 

A Junta do Supremo Governo instituída nesta cidade do Porto a instância do povo da mesma cidade, à qual se tem unido e se tem subordinado livre e espontaneamente as cidades, vilas e pessoas constituídas em dignidade dos estados eclesiástico, civil e militar, as províncias do Minho, Trás-os-Montes e Beira, e vai seguindo o mesmo exemplo a província do Alentejo; 
A Junta do Supremo Governo, aliada com o Reino de Galiza pelo tratado de 5 de Julho do ano corrente, reconhecida pela Grã-Bretanha, auxiliada e protegida pelos respeitáveis exércitos e esquadras da mesma nação britânica; 
A Junta do Supremo Governo, tendo tomado a gloriosa empresa de restaurar a Monarquia portuguesa em toda a sua extensão e de restituir a Coroa de Portugal ao seu legítimo Soberano, o Príncipe D. João Nosso Senhor, actualmente assistente nos seus Estados do Brasil. 
A mesma Junta, tendo para este fim tomado em consideração o resgate da cidade de Lisboa ainda tiranizada e oprimida pelo infame jugo do comum inimigo, e a total extinção ainda dos mais pequenos restos da dominação francesa em todo o Reino de Portugal;
E tendo outrossim tomado as medidas mais conformes e aderentes às Reais intenções do Príncipe Regente Nosso Senhor, e as mais proporcionadas e conducentes à tranquilidade e sossego dos povos de todo o Reino, tomou a resolução de fazer renascer e reintegrar o Conselho da Regência decretado pelo Príncipe Regente Nosso Senhor no dia 26 de Novembro do ano […] passado de 1807, sendo feita a renovação do dito Conselho na forma e com as declarações seguintes: 


PRIMEIRA.

O Desembargador Luís de Sequeira da Gama Ayala, membro desta Junta do Supremo Governo desde a sua instituição, por ordem da mesma Junta, em nome dela e com a sua autoridade vá à cidade de Lisboa, e juntamente com o Desembargador do Paço João António Salter de Mendonça, como Procurador da Coroa e Secretário do sobredito Conselho da Regência, e, na falta dele, com o Desembargador do Paço Manuel Nicolau Esteves Negrão, Chanceler Mor do Reino, logo que a cidade de Lisboa esteja livre do poder dos franceses, convocarão um congresso das pessoas seguintes: D. Francisco de Noronha, Francisco da Cunha, o Conde Monteiro Mor se estiver em Lisboa, D. Miguel Pereira Forjaz e os sobreditos Desembargadores Luís de Sequeira da Gama Ayala e João António Salter de Mendonça, ou, na falta dele, o Chanceler Mor Manuel Nicolau Esteves Negrão. 


SEGUNDA.

Neste congresso instituído na forma sobredita serão eleitos os membros que faltarem para o número dos cinco determinados por Sua Alteza Real no seu decreto de 26 de Novembro, com a exclusiva, porém, de todas as pessoas que, pela extinção do Conselho, passaram a ser membros do Governo francês, e com a advertência de que nesta eleição deverá lembrar que no decreto de 26 de Novembro se acha lembrado por Sua Alteza Real D. Miguel Pereira Forjaz, e no alvará de 23 de Novembro de 1674 são contemplados para a Regência do Reino os Arcebispos de Braga e Évora. 


TERCEIRA.

Os ajustes e contratos de qualquer modo feitos entre esta Junta do Supremo Governo e o Reino da Galiza e Grão Bretanha, ou com quaisquer pessoas deste Reino, se haverão logo por firmes e permanentes, a fim de que tenham o seu plenário e devido efeito. 


QUARTA.

O sobredito Conselho da Regência instituído e reintegrado na sobredita forma, logo que for reconhecido por esta Junta (e não antes) deverá reassumir o Governo de todo o Reino na forma em que lhe foi conferido pelo Príncipe Regente Nosso Senhor, e pelo mesmo facto do reconhecimento que esta Junta fizer do sobredito Conselho da Regência, ficará cessando toda a jurisdição e autoridade de que ela tem usado até agora. 
No caso, porém, em que o mesmo Conselho da Regência novamente restituído venha a ser alterado ou interrompido por nova invasão dos franceses (o que Deus não permita) ou por qualquer outro motivo, por esse mesmo facto esta Junta do Supremo Governo deverá logo reassumir e pôr em uso o mesmo poder, autoridade e jurisdição que tem tido desde a sua original instituição até agora. 

Porto, Paço Episcopal, em Junta, 4 de Agosto de 1808. 

[seguiam-se as assinaturas do Bispo presidente e dos deputados da Junta do Porto].

[Fonte: Correio Braziliense, Março de 1809, pp. 201-204; Simão José da Luz Soriano, História da Guerra Civil e do Estabelecimento do Governo Parlamentar em Portugal. Compreendendo a História Diplomática, Militar e Política deste Reino, desde 1777 até 1834 – Segunda Época - Tomo V – Parte I, Lisboa, Imprensa Nacional, 1893, pp. 225-227].


Ofício da Junta do Porto ao Almirante Charles Cotton sobre o restabelecimento do Governo da Regência (4 de Agosto de 1808)



Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor: 

A Junta de Governo instituída nesta cidade do Porto considera-se obrigada a participar a Vossa Excelência a forma de governo através da qual os seus membros pretendem governar Portugal, assim que a cidade de Lisboa esteja livre do governo dos franceses. 
É provável que a cidade de Lisboa não queira ser subordinada ao governo de qualquer outra cidade ou vila, tendo em conta que é a capital do reino; antes pelo contrário, pode querer ser reconhecida como suprema por todas as demais cidades, vilas e aldeias do Reino. 
E de forma a evitarem-se males que podem perturbar o povo antes que eles surjam, seria melhor abdicar de todo o direito ao governo, e reconhecer o governo estabelecido e legado pelo Príncipe Regente enquanto este exercia o poder supremo; um poder que agora está assente na junta de governo instituído na cidade do Porto, que julga ser acertado que a Regência seja restaurada na cidade de Lisboa, para cujo fim os seus membros enviaram um deputado com as bases mais simples e legais, esperando, com tal medida oportuna, evitar quaisquer desentendimentos ou desordens entre o povo.
A dita Junta de Governo roga ao Muito Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Almirante Charles Cotton que delibere sobre este importante assunto e que o ponha debaixo da sua poderosa protecção, por ser para o bem de todos e para o serviço do Príncipe. 
A dita Junta declara por este meio as suas obrigações, e sempre as manterá como sagradas, perante o Almirante Sir Charles Cotton.


Bispo, Presidente e Governador
José Dias de Oliveira
José de Mello Freire
Francisco Osório da Fonseca
Manuel Lopes Loureiro
António da Silva Pinto
Luís de Sequeira da Gama Ayala
António Mateus Freire de Andrade Coutinho

[Fonte: Copy of the Proceedings upont the Inquiry relative to The Armistice and Convention, &c. made and concluded in Portugal, in August 1808, between The Commanders of the British and Frensh Armies; - Held at the Royal Hospital at Chelsea, on Monday the 14th of November; and continued by Adjournments until Tuesday the 27th December, 1808, Order by The House of Commons to be printed, 31st January 1809, p. 213 (n.º 125). Existem outras traduções in Correio Braziliense, Março de 1809, pp. 200-201; Simão José da Luz Soriano, História da Guerra Civil e do Estabelecimento do Governo Parlamentar em Portugal. Compreendendo a História Diplomática, Militar e Política deste Reino, desde 1777 até 1834 – Segunda Época - Tomo V – Parte I, Lisboa, Imprensa Nacional, 1893, pp. 224-225].

Proclamação dos Comandantes em Chefe das forças de Sua Majestade Britânica empregadas em auxílio dos leais habitantes do Reino de Portugal (4 de Agosto de 1808)






[Fonte: Arquivo Histórico Militar, 1.ª div., 14.ª sec., cx. 182, doc. 83. Publicado também, entre muitas outras fontes, na Minerva Lusitana, n.º 19, Coimbra, 11 de Agosto de 1808
Nota: A minuta desta proclamação foi escrita a 2 de Agosto de 1808 pelo Almirante Charles Cotton, tendo Wellesley apenas modificado a data e acrescentado a sua assinatura quando a mandou traduzir e publicar].

Carta do General Wellesley para o Almirante Charles Cotton (4 de Agosto de 1808)




Quartel-General de Lavos, 4 de Agosto de 1808 


Senhor: 

Acabei de ter a honra de receber os vossos ofícios dos dias 29 e 31, através do Scout
Na carta que tive a honra de vos enviar a 31 de Julho, pedia que se chegasse ao Tejo a frota que tem a bordo o General Spencer, ou a que tem os reforços vindos da Inglaterra, daríeis ordens para virem para a Figueira; deduzo assim que ordenastes à frota de transportes que tem a bordo o General Spencer para vir para aqui imediatamente. Considerando todas as informações que trocámos sobre o assunto do desembarque na baía de Lisboa, ou mais para norte, nos arredores do cabo da Roca, convenci-me que seria uma empresa perigosa para aqueles que o tentassem, tal como para aqueles que dependeriam da assistência e da cooperação das tropas que desembarcassem aí, como previsto. Em relação ao desembarque no território a sul do Tejo, pareceu-me que provocaria uma divisão da nossa força, possivelmente com más consequências para uma ou mesmo para ambas as partes; e por isso, perante todas as circunstâncias, pensei que seria melhor concentrar a nossa força sem demora e desembarcar tudo aqui, que em todos aspectos é o melhor lugar que se pode escolher para executar o ataque sobre a força do inimigo em Portugal. Com estes fundamentos, pedi-vos para enviardes o General Spencer para aqui, e, esperando pela sua chegada, desembarquei o meu próprio corpo, e espero apenas pela sua junção para começar as minhas operações. 
Estou plenamente consciente da vantagem que teremos ao desviarmos a atenção do inimigo sobre a baía da Lisboa, durante a minha marcha até essa cidade; e proponho, com o vosso acordo, enviar para a esquadra um batalhão que não é muito competente para fazer uma marcha activa, mas que pode permitir-vos, com a assistência dos soldados da marinha da esquadra, que façais uma diversão muito oportuna a meu favor. 
Tinha ouvido um rumor sobre um destacamento do exército francês que atravessara o Tejo, e receei pelo destino do destacamento espanhol no Alentejo; e fico contente em saber agora, através duma boa autoridade, que esse destacamento [francês] regressou para o norte [do Tejo]. 
Tenho a honra de ser, etc. 

Arthur Wellesley 

[Fonte: Lieut. Colonel Gurwood (org.), The Dispatches of Field Marshal the Duke of Wellington, K. G. during his various campaigns in India, Denmark, Portugal, Spain, the Low Countries, and France, from 1799 to 1818 – Volume Fourth, London, John Murray, 1835, pp. 48-49].

Carta do General Wellesley para o Tenente Coronel Brown (4 de Agosto de 1808)




Lavos, 4 de Agosto de 1808 


Meu caro Senhor: 

Acabo de receber a vossa carta do dia 3, e estou muito agradecido pelos esforços que fizestes para conseguir as mulas para nós; se conseguirdes 100, suponho que este número será suficiente. 
Ficaria contente de vos ver aqui, juntamente com Mr. Walsh, logo que puderem vir. Espero o General Spencer e o seu corpo a todo o instante, e tenciono marchar logo que ele chegue. 
Temos muitas dificuldades devido à falta de cerca de 150 mulas de carga, que deviam completar o número dos cavalos de carga da artilharia do General Spencer, pois tinha a esperança de já ter as 500 que Mr. Walsh deveria ter conseguido comprar. Poderá ele, ou vós, ou o Comandante em Chefe português, fazer algo para nos ajudar a este respeito? Não há mulas de carga na zona? 
Estou-vos agradecido pela minha carruagem e carroça, que tinha pedido para enviardes para aqui assim que o pudésseis. Contudo, o Bispo deve receber o pagamento delas. 
Dizei ao Coronel Trant que não lhe tenho escrito porque nada tenho para lhe dizer particularmente.
Recebi notícias oficiais, da parte de Sir Charles Cotton e de Sevilha, sobre a vitória de Castaños. 
Os franceses que atravessaram o Tejo no dia 26, retiram-se novamente para este lado do rio antes do dia 31. Deveis dizer aos deputados em Coimbra, e ao Bispo, que esta informação é exacta. 
Acreditai em mim, etc. 

Arthur Wellesley 

[Fonte: Lieut. Colonel Gurwood (org.), The Dispatches of Field Marshal the Duke of Wellington, K. G. during his various campaigns in India, Denmark, Portugal, Spain, the Low Countries, and France, from 1799 to 1818 – Volume Fourth, London, John Murray, 1835, p. 49].

Relação da deserção de um Corpo de Cavalaria da Guarda da Polícia de Lisboa, que chegou a Coimbra no dia 4 de Agosto de 1808




Relação da deserção de um Corpo de Cavalaria da Guarda da Polícia de Lisboa, que chegou a esta Cidade no dia 4 do corrente. 


Constando-nos que na cidade de Coimbra e [nas] províncias do Norte se havia aclamado o Príncipe Regente Nosso Senhor, e organizado um considerável exército para expulsar do Lisboa e de mais partes destes Reinos os usurpadores e pérfidos franceses, nos determinámos a comunicar os nossos sentimentos patrióticos a alguns dos nossos Oficiais, que não se conformaram com os nossos projectos, talvez por falta de resolução, por temor, ou por circunstâncias urgentes e particulares; mas não esmorecendo por isso, antes cada vez mais firmes em nosso propósito, conviemos em nos ausentar de Lisboa, como com efeito o fizemos pelas 2 horas da noite [de 2 de Agosto], Elesiário de Carvalho, António Vieira, Joaquim Miguel de Andrada, Joaquim Manuel Ferreira Pratas, Tomás Pessoa, Domingos José Teixeira, José Germano, Joaquim António, António José de Castro e João Manuel, sendo as particularidades desta arriscada empresa as seguintes:
À uma hora da noite, o dito Elesiário, comandante da primeira Companhia, aquartelada às Necessidades, apresentando-se na frente dos seus Soldados, os convidou para o seguirem na gloriosa empresa do restabelecimento de Portugal, que havia sido tão vilmente usurpado ao seu legítimo Senhor, intimando-lhes ao mesmo tempo, com eficácia e energia, a crítica situação a que se veriam reduzidos quando um Exército português e resgatador se avizinhasse do Corpo a que pertenciam; que eles seriam forçados, no mais terrível e horroroso combate, a travar peleja com os seus mesmos compatriotas, assassinando-se reciprocamente; que por fim a vitória deveria infalivelmente pertencer ao furor e justa vingança dos esforçados e intrépidos portugueses; que se alguns deste Corpo sobrevivessem aos seus desgraçados camaradas, seria para sofrerem outra desgraça ainda maior, como a de verem cair na sua frente montões de cadáveres, alguns dos quais talvez seriam seus pais, suas esposas, seus filhos, seus amigos e patrícios, e que todos finalmente deviam desterrar a horrorosa ideia de favorecer a causa da perfídia e da irreligião; de acrescentar as forças do inimigo universal do género humano, de sustentar a mais insaciável ambição e despotismo, e de concorrer para elevar sobre ossadas de nossos semelhantes, e só para uma família, os tronos aleivosamente usurpados aos seus legítimos Senhores. 
Acabadas de proferir estas palavras, que fizeram nos ânimos dos Soldados a mais viva sensação, cada um quer ser o primeiro a declarar a sua vontade e desejos de partir: dá-se a primeira voz; formam-se as fileiras, e a Companhia, que despreza todos os obstáculos, dirige-se imediatamente para o Campo Grande, lugar indicado para a reunião da tropa, que foi então comandada pelo Sargento Teixeira, enquanto o mesmo Elesiário, que se havia encarregado de fazer sair a quarta Companhia, aquartelada ao Salitre, se encaminha para este sítio, e depois de fazer levantar os Soldados com o pretexto de uma diligência, lhes fala do mesmo modo que à primeira [Companhia], sendo igual o resultado, e observando em todos o mesmo entusiasmo, sem embargo de não ser seu Comandante o que lhes influía estes sentimentos, e partem como raios para o lugar aprazado. Já o sobredito Comandante, que nessa ocasião servia de Ajudante, tinha mandado ordem antecipada à segunda Companhia aquartelada em Andaluz, para partir a auxiliar o Corregedor mor em Vila Franca: o Furriel Castro, que a comandava, tinha sido prevenido, e em consequência daquela ordem estava formando um numeroso piquete, que logo parte a executá-la. A terceira Companhia foi convocada ao mesmo tempo pelo Sargento Tomás, de quem os Soldados fazem todo o bom conceito, e de acordo com o seu camarada Prata apronta-se tudo, e foi a primeira que se apresentou no Campo. 
Reunidas as Companhias, achou-se logo formado um Esquadrão de 56 filas, comandadas pelo referido Elesiário, e imediato o Andrada: marchando para o seu destino, esta coluna segurava a retaguarda por uma grande guarda na sua frente, adiantando-se a três quartos de légua de distância vedetas e exploradores, que se comunicavam com a frente da mesma coluna; e seguindo a estrada de Loures passámos ao Tojal, Sobral e Merciana, aonde se adiantou um piquete da Retaguarda com o Sargento Gamboa em sua companhia, o qual tinha recebido uma ajuda de custo, e uma ordem de Novion para o Governador francês de Santarém, do teor seguinte: 


O sobredito Sargento Gamboa, honrado e fiel português, que juntamente com todos os seus camaradas tinha servido sempre com a maior repugnância e rancor contra o Governo francês, em lugar de executar a referida ordem, veio associar-se connosco, e seguimos a nossa marcha por veredas e desfiladeiros impraticáveis e arriscados; às 10 da noite forrageámos no sítio de Alagoa, donde, sendo avisados que uma coluna francesa se dirigia para nós da parte de Óbidos, nos retirámos imediatamente, não desestimando que se nos oferecessem meios de algum encontro, contanto que não nos desviássemos da nossa direcção; ao amanhecer estávamos nos Carvalhos, e no momento do maior repouso, fomos novamente avisados que de Rio Maior ou de Alcobaça vinha tropa em nosso alcance; tomámos para a Batalha, e daí para Leiria, aonde chegámos à uma hora da tarde; observámos com o mais vivo prazer a actividade do Exército português, porque ao sair de Leiria e de Pombal a estrada oferecia a mais desvelada vigilância dos postos avançados do Campo de Pombal, aonde chegámos às 3 da manhã; às 7 da noite marchámos para Condeixa; mas qual não foi o nosso entusiasmo pela verificação das nossas esperanças, quando uma forte coluna de Infantaria desdobrava na nossa frente para nos facilitar o passo para Coimbra, aonde chegámos à uma hora da tarde! Fomos conduzidos pelo Comandante de Cavalaria, que ali se achava, e seguidos de um piquete daquela guarnição, dirigindo-nos a casa do Excelentíssimo Governador, e  daí à do Excelentíssimo General Nuno Freire de Andrade, depois de grandes aclamações e repetidos vivas de todo o Povo, que nos olhava com entusiasmo, e aplaudia a nossa fidelidade. O Comandante Elesiário dirigiu ao Senhor General a seguinte fala: 

Ilustre General: Soldados valentes, e fiéis Portugueses se apresentam diante de vós; se temos abandonado os nossos postos, foi só para unir as nossas às forças do vosso Exército, e para nos cair também alguma parte da glória de concorrer para o restabelecimento do Governo do nosso amado PRÍNCIPE REGENTE, a quem unicamente reconhecemos e respeitamos, como Legitimo Soberano de Portugal. A empresa da Restauração é heróica; a nossa fidelidade, inalterável, e debaixo do vosso comando não tememos encarar os perigos, o inimigo a morte. 

Assinado: Elesiário de Carvalho 


Três cartas do Arcebispo de Évora às autoridades de Serpa, Moura e Portel, com avisos para não resistirem ao exército francês (4 de Agosto de 1808)



Ilustríssimo Senhor Juiz de Fora de Serpa:

O meu amor antigo a essa vila insta-me para eu lhe fazer este aviso. Creio que já haverá constado nessa vila a situação funesta desta cidade de Évora. Resistiu ao Exército francês persuadida de ter forças; achou-se enganada, e foi assaltada pelo mesmo Exército, saqueada, e graças a Deus que não ficou de todo consumida.
Se aí se deseja Salvação, podem fazer o que praticou Estremoz: abriu-lhe as portas e foi a vila bem tratada. Vossa Senhoria tome o seu parecer, e desejo que seja o que é conveniente. 
Deus guarde a Vossa Senhoria muitos anos.
Évora, em quatro de Agosto de mil oitocentos e oito.

De Vossa Senhoria muito obrigado servo,
Frei Manuel, Arcebispo de Évora


***


Ilustríssimo Senhor Doutor Juiz de Fora de Moura:

Obriga-me a experiência triste a fazer a Vossa Senhoria este aviso para seu governo. Bem sabe, digo, bem notório é o caso funesto de Évora, porque resistiu ao Exército francês. Évora resistiu; o Exército ficou vencedor, assaltou a cidade, e fez nela um saque muito circunstanciado. Se aí houver alguma resistência lhe sucederá o mesmo. Pelo que Estremoz tomou bom conselho, abriu as portas e recebeu em paz os franceses, e evitou o destino. Eu dirijo a Vossa Senhoria este exemplo saudável de Estremoz, e a catástrofe de Évora. Vossa Senhoria tomará o seu parecer. 
Deus guarde a Vossa Senhoria muitos anos.
Évora, em quatro de Agosto de mil oitocentos e oito.

De Vossa Senhoria servo muito obrigado,
Frei Manuel, Arcebispo de Évora


***


Aos do Governo de Portel.

Habitantes de Portel:

À vossa testa tendes Magistrados reconhecidos pelo nosso Governo legítimo do Excelentíssimo Senhor Duque de Abrantes, e organizados debaixo dos auspícios de Sua Excelência o Senhor General Conde do Império Loison. A Junta criada pelo punhal dos espanhóis já não existe; entrou na razão, e na boa ordem. Deponde as vossas armas, trazei-as aos pés dos vossos Magistrados, os quais as entregarão a Sua Excelência o Conde do Império e tudo será perdoado. Os soldados franceses, que vos tratam ainda como inimigos, porque muitos dentre vós estão ainda em armas, virão a ser vossos protectores e vossos amigos. Vós não tendes tempo a perder: deponde as vossas armas; infeliz será o habitante que daqui a duas horas estiver ainda armado. Sua Excelência tem pronunciado sua sentença, e o habitante será morto.

Frei Manuel Arcebispo de Évora
O Coronel Lercado[?] Andersen
O Doutor João Limpo Pimentel
O Cónego Francisco Teles de Mira[?]
O Vigário Geral António José de Oliveira


[Fonte dos três documentos: Arquivo Histórico Militar, 1.ª div., 14.ª sec., cx. 2, doc. 49].

Proclamação de D. Domingos António de Sousa Coutinho, embaixador de Portugal em Londres, aos portugueses refugiados na Inglaterra




[Fonte: Arquivo Histórico Militar, 1.ª div., 14.ª sec., cx. 182, doc. 83]. 

Decreto de D. Domingos António de Sousa Coutinho, embaixador de Portugal em Londres, sobre a organização da Leal Legião Lusitana, corpo que seria composto por desertores e exilados portugueses que se encontravam refugiados na Inglaterra (4 de Agosto de 1808)







[Fonte: Arquivo Histórico Militar, 1.ª div., 14.ª sec., cx. 182, doc. 83]. 

Proclamação do Papa Pio VII aos espanhóis





Nota: Recordemos que o território pontifício de Roma tinha sido ocupado pelos exércitos de Napoleão em Fevereiro de 1808, através de um estratagema semelhante ao praticado na Espanha.