segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Assento do Conselho Militar do Exército português em Leiria (15 de Agosto de 1808)



Havendo-se assentado unanimemente no Conselho que se convocou no dia 13 do corrente que se devia assentir à proposta que, em nome do General Wellesley, expôs o Coronel Trant, de se lhe mandar um reforço de mil homens de Infantaria, os Caçadores e a Cavalaria do Exército, salvo este último artigo, em que pareceu conveniente que sim se mandasse Cavalaria, mas não toda; no dia 15 do corrente, depois de haver marchado na véspera o corpo de tropas requerido, fez o Coronel Trant apresentar uma cópia autêntica duma carta do General Wellesley em que este oferecia uma certa análise dos sucessos que poderiam ter as suas operações, e a influência que teriam sobre as nossas, desaprovando o plano de operações proposto pelo General do Exército português, e finalmente declarando que o objecto dos movimentos do Exército inglês era a ocupação de Lisboa por qualquer modo que fosse, marchando directamente sobre esta capital, sem se ocupar com os movimentos do inimigo, quaisquer que eles pudessem ser, e convidando por assim o dizer o Exército português a tomar parte na empresa sem alternativa outra que não fosse ou de marchar o Exército português a unir-se com o inglês, ou de ele General Wellesley o considerar desligado das suas operações e em risco de sucumbir se o General Junto tentasse desviar-se do Exército inglês para cair sobre o nosso e efectuar a destruição do centro das nossas forças, sendo este novo incidente de suma gravidade do conceito do General do nosso Exército, cuja disposição tinha sido sempre obrar de acordo com os ingleses e apoiar os seus movimentos, na inteligência de que o Exército britânico se dirigia a combater o inimigo em qualquer parte da Estremadura por ele ocupada até o reduzir a um estado que, livrando a capital, livrasse também o Reino, e que o seu plano não era só limitado à ocupação de Lisboa, como dava a entender a requisição do Coronel Trant que deu motivo ao Conselho do dia 13; resolveu-se pois o General do Exército a propor a matéria em conselho, assim porque o negócio o pedia, como porque não se dissesse que ele tomava sobre si medidas arriscadas.
Foi o voto do Conselho:
Que não obstante poder-se aparentemente comprometido o crédito do Exército, contudo não era esse motivo suficiente para decidir o Exército português a marchar por Alcobaça em seguimento dos ingleses; porque limitando-se o objecto destes à ocupação de Lisboa, e não tendo em vista a expulsão do Exército francês de qualquer outro ponto do Reino, não preenchia os fins para que as províncias do norte concorreram em levantar o nosso Exército, pois que a ocupação de Lisboa, não se havendo anteriormente destroçado dos franceses, não punha a salvo das incursões de uns desesperados aos povos das mesmas províncias, e que consequentemente nesta diversidade de objectos, quaisquer que fossem os sucessos dos ingleses em consequência da aceleração das suas marchas, o nosso Exércio não podia nem devia acompanhá-los, o que suposto as instruções do Supremo Governo [do Porto] determinassem ao General obrar de acordo com o Exército britânico, estas mesmas instruções que exactamente se cumpriram até à chegada a Leiria, não podiam já ter lugar depois da declaração do General Wellesley, porque estas nem previram nem podiam prever a determinação deste General; em tal caso, o mesmo Conselho entendeu que o objecto das operações não devia ser outro senão postar-se o nosso Exército de forma que, podendo ser dalgum apoio ao Exército inglês, no caso de este ser repelido, estivessem os portugueses à mão de cooperar com os ingleses, se os franceses se reunissem ou de obstar-lhes a entrada das províncias, em situação que pudessem reunir-se as forças portuguesas e preencher assim as vistas dos verdadeiros patriotas, que confiaram deste Exército a conservação das suas vidas, honra e fazenda, e a essencial obrigação de promover em todos os povos a manifestação dos seus leais desejos, pondo os mesmos povos em estado de cooperar connosco para o fim da restauração do Reino, e para desempenhar pois o objecto de cobrir as províncias do norte, pareceu aos vogais do conselho que todas as operações do Exército português, depois de reforçadas com os corpos mais vizinhos, se deviam limitar ao espaço compreendido desde o Tejo até à estrada real de Leiria para Lisboa, regulando-se de alguma forma pelos movimentos dos franceses que ocupam Santarém e Rio Maior, e que estão em posição de escolher quaisquer das duas estradas, velha ou nova, quando não tentem reunir-se com as outras divisões que se acham em frente dos ingleses, e que em todo o caso não se achando os franceses em grande força em Santarém, devia o Exército português avançar-se às alturas de cá de Rio Maior. Tomando o Conselho esta deliberação, que se fará presente à Suprema Junta do Governo [do Porto], por não ser compatível com a urgência do negócio obter-se uma peremptória decisão sujeitando-se em todo o caso os Vogais do Conselho às supremas determinações da Junta do Governo, que ordenará o que for mais do Real agrado.
Quartel-General de Leiria, 15 de Agosto de 1808.

Bernardim Freire.
D. Miguel Pereira Forjaz.
Nuno Freire de Andrade*.
Francisco da Silveira Pinto da Fonseca.
Aires Pinto de Sousa.
Luís Gomes de Carvalho.
Filipe de Sousa Canavarro.



[Fonte: Luís Henrique Pacheco Simões (org.), "Serie chronologica da correspondencia diplomatica militar mais importante do General Bernardim Freire de Andrade, Commandante em Chefe do Exercito Portuguez destinado ao resgate de Lisboa com a Junta Provisional do Governo Supremo estabelecido na cidade do Porto e o Quartel General do Exercito Auxiliar de S. Magestade Britanica em Portugal", in Boletim do Arquivo Histórico Militar - Vol. I, Lisboa, 1930, pp. 153-227, pp. 189-190 (incluído no doc. 17)].
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Nota: 

* Nuno Freire d'Almeida [sic], no texto original, gralha esta que corrigimos. Tratava-se de um irmão do próprio General Bernardim Freire de Andrade. Sobre os outros nomes, ver o assento de 13 de Agosto do mesmo Conselho Militar.

Carta do General Bernardim Freire de Andrade ao General Wellesley (15 de Agosto de 1808)



Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor:


Quando eu tinha escrito Vossa Excelência a carta junta, recebo a cópia oficial da que Vossa Excelência dirigiu ontem ao Coronel Trant sobre o plano de operações que eu tinha proposto a Vossa Excelência, e como por ela vejo Vossa Excelência se propõe, de preferência a tudo, ocupar Lisboa, mesmo no caso de se poder evadir o Exército do General Junot, quando queira evitar uma batalha, e como semelhante acontecimento, muito possível, como Vossa Excelência mesmo observa na sua sua carta, exporia absolutamente as províncias que eu de preferência devo defender, vejo-me forçado a declarar a Vossa Excelência que eu não posso abandonar a defesa destas províncias a que este Exército pertence, e o mesmo Exército que Vossa Excelência reconhece ser o núcleo*das forças que devem sustentar esta Monarquia.
Esta guerra não é das ordinárias, na qual importa menos que o inimigo se avance em uma ou outra província; agora a desolação e a morte acompanhará por toda a parte a sua chegada, e o primeiro dever é sacrificar-me, se puder ser, para evitar que semelhantes calamidades se estendam às províncias deste Reino, cujo Exército comando.
Nestas circunstâncias, longe de me prestar à requisição de Vossa Excelência, de marchar com as poucas tropas que me restam, tendo já ontem destacado o contingente que Vossa Excelência exigiu, vou procurar reforçar-me quanto possa, a fim de obstar ao perigo que possam correr as províncias, e para concorrer com as tropas de Vossa Excelência para extinguir o inimigo comum, que era o nosso primeiro e único objecto, ou me sacrificarei sendo preciso, para retardar esta fatal consequência, que parece ameaçar-nos iminentemente e de que resultaria, sem dúvida, uma contra-revolução no país, no sentido mais desastrado.
Posso assegurar a Vossa Excelência que sinto muito não poder falar noutros termos nesta ocasião, em qualidade de comandante destas tropas, mas estou certo que o meu dever assim o pede, e muito seguro de que o Supremo Governo o há de aprovar.
Deus guarde a Vossa Excelência.
Quartel-General de Leiria, 15 de Agosto de 1808.
Sou, etc.

Bernardim Freire de Andrada [sic].

[Fonte: Luís Henrique Pacheco Simões (org.), "Serie chronologica da correspondencia diplomatica militar mais importante do General Bernardim Freire de Andrade, Commandante em Chefe do Exercito Portuguez destinado ao resgate de Lisboa com a Junta Provisional do Governo Supremo estabelecido na cidade do Porto e o Quartel General do Exercito Auxiliar de S. Magestade Britanica em Portugal", in Boletim do Arquivo Histórico Militar - Vol. I, Lisboa, 1930, pp. 153-227, pp. 184-185 (doc. 16)].

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Nota: 


* Devemos notar que sublinhámos a palavra "núcleo" para destacar que a utilizámos para substituir o termo "novelo", que aparecia na carta original de Bernardim Freire de Andrade, por se tratar de uma gralha evidente, que resultou de uma má interpretação do termo francês "noyau", inserido na seguinte passagem da carta que Wellesley enviou a Nicholas Trant no dia 14 de Agosto (cuja cópia, traduzida em francês, foi enviada por este último a Bernardim Freire de Andrade): "ce corp de l'Armée qui peut avec justice être qualifié de Noyau de l'Armée Portugaise, l'appui de la contre-révolution et soutient de la Monarchie".

Carta do General Bernardim Freire de Andrade ao Bispo e Presidente da Junta do Porto (15 de Agosto de 1808)



Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor:



Na minha última carta* dizia a Vossa Excelência que eu me determinava a tomar com a tropa às minhas ordens uma direcção com que, não deixando de apoiar o Exército inglês, pudesse ao mesmo tempo vigiar no que fizessem os franceses que tínhamos ainda na nossa esquerda, pois que não tendo absolutamente sido possível seguir a marcha das colunas inglesas, por falta absoluta de subsistências, uma vez que elas não me podiam fornecer alguns dias de biscoito, desde que chegassem a Alcobaça até que se pudesse arranjar essa repartição, que achei absolutamente desmontada. Verá Vossa Excelência das cópias inclusas o que se tem passado depois e a que ponto me tenho visto comprometido por falta de instruções, pois que nelas não se me diz expressamente se devo, como os ingleses, cuidar em primeiro lugar em ocupar Lisboa, ainda com o risco de deixar devastar as províncias que fizeram a Revolução, e todos os esforços que é constante, e que devem esperar de nós este serviço, ou se deve ser este o nosso objecto. Confesso a Vossa Excelência que tenho passado horas amarguradas, vendo comprometida mesmo talvez a minha reputação, pois que não me convém dar explicações a ninguém, nem fazer aparecer coisa que possa ter aparência de menos inteligência entre nós e os ingleses. Porém, Deus há de acudir a quem, como eu, não procura senão acertar, sem outra alguma paixão nem parcialidade.
Esta resolução tinha eu tomado depois de receber uma carta em que o General Wellesley se me explicava muito amigavelmente a respeito da requisição que eu lhe tinha feito fazer pelo Coronel Trant, para me fornecer biscoito, como já disse; e na minha resposta eu lhe comunicava aquele projecto que me parecia oportuno**. Nessa noite recebi uma participação feita pelo Coronel Trant, em que o General, não aprovando aquele plano, como Vossa Excelência verá  da cópia n.º 1***, me vi obrigado a chamar os principais oficiais deste Exército para ouvirem as proposições do General inglês. O resultado deste conselho verá Vossa Excelência da cópia n.º 2, em consequência do que destaquei a tropa, de cuja resolução me pareceu satisfeito o Coronel, o que prova exuberantemente quanto eu procuro prestar-me às requisições dos ingleses, para fazer ver a boa fé com que procedo a seu respeito, ainda em coisas de tanta consequência. Para substituir esta falta, mandei que de Coimbra marchassem um Batalhão de Granadeiros e o de Caçadores de Trás-os-Montes, prosseguindo no mesmo projecto de não desamparar o que nos fica à esquerda, ainda ficando sem outro apoio que o das minhas próprias forças. Quando ontem estava a marchar recebi uma carta do Coronel Trant remetendo-me a cópia da que recebera do General Wellesley, à qual respondi como Vossa Excelência verá do n.º 3Vossa Excelência poderá julgar dos motivos que me têm resolvido a tomar este partido, que se não é o mais brilhante, é o mais sólido, e nisto mesmo me confirma a notícia de que Loison se tinha recolhido a Santarém, onde estava ontem pelas 6 da manhã; mas enquanto me chegam as notícias da marcha pomposa do Exército inglês, eu fico em inacção observando os movimentos dos franceses nesta distância, sem poder adivinhar aonde hei de dirigir-me.
As medidas que se têm tomado são as seguintes: 
Mandar ao Brigadeiro Bacelar descer de Castelo Branco a Abrantes, para ocupar esta praça no caso de ser abandonada, ou de conservarem ali os franceses forças com que ele possa revolucionar os povos e vir a Tomar a observar os movimentos do inimigo; as forças de que ele pode dispor são 3.000 homens, pouco mais ou menos; 
Mandar-se proclamar o Príncipe por toda a parte onde dominamos, e armar o povo;
Mandar estabelecer vigias nas vizinhanças de Santarém para ser informado das disposições do inimigo;
Fazer as que são necessárias para que os habitantes de Ribatejo se revoltem logo que ali apareça alguma força.
São estas as disposições que se podem fazer, e ficar este Exército pronto a marchar ao primeiro aviso, com as bagagens e duas rações de pão e etapa****, que o acompanharão para qualquer parte. Mas enquanto me ocupo destes muito sério cuidados, o General inglês se avança sem puder encontrar grande oposição, pois que a Divisão de Loison ainda por cá fica, e eu deixo de entrar com ele em Lisboa, como eu devia fazer, se não me parecesse ainda mais essencialmente do meu dever procurar, quanto em mim possa caber, obstar a que os franceses vão repetir na Beira e províncias do norte as cenas que ultimamente assolaram o Alentejo.
Supondo que escolhi o melhor partido, desejo que Vossa Excelência assim o entenda, e o Supremo Conselho. Desejo mil ocasiões de servir a Vossa Excelência.
Deus guarde a Vossa Excelência.
Quartel-General de Leiria, 15 de Agosto de 1808.
Sou, etc.

Bernardim Freire de Andrada [sic].

[Fonte: Luís Henrique Pacheco Simões (org.), "Serie chronologica da correspondencia diplomatica militar mais importante do General Bernardim Freire de Andrade, Commandante em Chefe do Exercito Portuguez destinado ao resgate de Lisboa com a Junta Provisional do Governo Supremo estabelecido na cidade do Porto e o Quartel General do Exercito Auxiliar de S. Magestade Britanica em Portugal", in Boletim do Arquivo Histórico Militar - Vol. I, Lisboa, 1930, pp. 153-227, pp. 185-186 (doc. 17)].

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Nota: 

* Como atrás referimos, não nos consta que a aludida carta de Bernardim Freire de Andrade ao Bispo do Porto (escrita possivelmente a 13 de Agosto) esteja publicada.


** Já tivemos ocasião de referir que também não se encontra publicada a carta em que Bernardim Freire de Andrade comunicava a Wellesley o seu novo plano de operações, o qual somente se conhece através de referências indirectas.


*** Como também já referimos, não nos consta que esteja publicada a aludida carta de Bernardim Freire de Andrade a Wellesley, onde era comunicado o novo plano de operações proposto pelo General português.


*** Sobre este termo, ver o que atrás anotámos.

Discurso de Sebastião Martins Mestre às tropas do Exército do Sul (15 de Agosto de 1808)




Companheiros, amigos e camaradas (ditoso o que merece este nome):
Já não vamos a proteger Évora (como nos tinham ordenado). Eu que tenho a honra de ser vosso chefe e companheiro, acabo de receber ordem da Junta Suprema de Beja e do nosso Marechal de Campo José Lopes de Sousa para retroceder a nossa marcha, para ir atacar o inimigo que se acha na vila de Alcácer do Sal debaixo das ordens do General Kellermann, para saquear e incendiar esta vila, e depois passar aos mais povos da província. 
Vós, meus Soldados, não me negareis que, debaixo das ordens do nosso Marechal de campo José Lopes de Sousa, eu, com um punhado de pescadores, fizemos abater o orgulho da Legião do Meio-dia, no lugar de Olhão, tanto na abordagem que lhe demos no mar no dia 17 de Junho, como na tarde do mesmo dia na ponte de Quelfes*; para cada um destes pescadores o inimigo tinha dez vencedores do Marengo, Jena e Friedland, contudo o que não foi morto foi posto em fuga ou [feito] prisioneiro. Vós sois igualmente Algarvios, sois Soldados Generosos que sem mais auxílio do que o vosso valor fizestes afugentar do Algarve o inimigo, e com o mesmo valor e inexplicável generosidade vos oferecestes voluntários para defender a província do Alentejo, e a mesma capital de Lisboa. Pois companheiros, amigos e Irmãos, estes que vamos combater e vencer são os mesmos cobardes que nos fugiram do Algarve. É verdade que os vereis vestidos de Tigres, mas é porque estão salpicados com o sangue dos inocentes e impossibilitados moradores de Beja e Évora, de cuja maldade, se não tomarmos vingança, aquelas mesmas vítimas inocentes, se as não vingais no sepulcro, os seus ossos rechaçarão os nossos com desprezos, estas honradas palavras não vo-las digo como vosso chefe, se não como um Soldado, como um vosso companheiro que aspira a conduzir-vos à glória: ver-me-eis entrar por entre os inimigos desprezando as suas baionetas, e comendo a morte aos bocados.
Aguiar, 15 de Agosto de 1808, à uma hora da tarde.

Sebastião Martins Mestre, Tenente-Coronel.
Comandante

[Fonte: Continuação da narração dos acontecimentos que occorrerão na vanguarda do Exercito do Algarve comandada pelo Tenente Coronel Sebastião Martins Mestre, apud Alberto Iria, A Invasão de Junot no Algarve, Lisboa, s. ed., 1941, pp. 329-334, pp. 330-331 (Doc. 6)].

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Notas:

Este discurso foi pronunciado na vila de Aguiar (actualmente pertencente a Viana do Alentejo), precisamente antes do chamado Exército do Sul rumar a Alcácer do Sal. Sebastião Martins Mestre, um dos comandantes do dito exército, incentivava os seus soldados com o exemplo dos confrontos que, com escassos meios, venceu em Olhão. Pelos seus feitos desde que tinha começado a rebelião algarvia, a Junta Governativa de Beja tinha-o entretanto condecorando com a patente de Tenente-Coronel (e a José Lopes de Sousa com a referida patente de Marechal de Campo). 


* Sebastião Martins Mestre, ou a pessoa que fixou o texto, equivocou-se quando assentou que os dois citados confrontos ocorreram no dia 17 de Junho, quando os mesmos se passaram na verdade no dia 18 de Junho de 1808, como se poderá confirmar nas fontes sobre a restauração do Algarve principiada em Olhão.

Soneto ao festejo que fez Junot em Lisboa pelos anos de Bonaparte





Soneto de Ópio


De Soléques, Meliques, Trapalóques,
Sulfúrios, sulfurantes, sulfurados,
Rotundos, salitrosos, carvonados,
Bum, bum, bum, bum, ressoam címbaloques;

Espaventos flamantes, trapiquoques, 
Imbeles, infecundos, insolados,
Xenofes, Xenofontes, Xenofados,
Tripudiam berliques e berloques,

Strangurio, scalponio, figurato, 
Gerivásio de gimbo, que gambeia
No Zimbório de Boreas, boreato.

Eis aqui o primor com que se arreia
O dia natalício celebrato 
De um tal Napoleão em terra alheia.


Aviso sobre a celebração do aniversário de Napoleão no Teatro de S. Carlos em Lisboa (15 de Agosto de 1808)





[Fonte: 1.º Supplemento à Gazeta de Lisboa, n.º 30, 15 de Agosto de 1808].

Notícias publicadas na Gazeta de Lisboa sobre as novidades da Espanha, conforme tinham sido noticiadas em dois números do Diario de Badajoz (15 de Agosto de 1808)




[Fonte: 1.º Supplemento à Gazeta de Lisboa, n.º 30, 15 de Agosto de 1808].

Decreto de Junot sobre a continuação das reuniões do Conselho de Governo durante a sua ausência de Lisboa (15 de Agosto de 1808)




O Duque de Abrantes, General em Chefe do Exército francês, decreta o seguinte:

Artigo I. Durante a minha ausência juntar-se-á o Conselho todas as vezes que as circunstâncias o exigirem; será presidido por um dos Secretários de Estado por seu turno. Os negócios seguirão o curso ordinário das leis e dos tribunais.

Artigo II. O Conselho do Governo poderá chamar às suas sessões os chefes das primeiras autoridades, tais como o Presidente do Senado, ou dos tribunais superiores; algumas pessoas da nobreza e do clero que gozarem de maior consideração em Lisboa; alguns proprietários ou negociantes de reconhecida probidade e inteligência, para os consultar sobre o estado actual da cidade, para tomarem de comum acordo todas as medidas que as circunstâncias exigirem e permitirem; e enfim, para conservar sempre a tranquilidade e a abundância que, graças Deus, tem havido até aqui, e que espero não acabe durante a minha ausência.

Artigo III. O Conselho corresponder-se-á diariamente comigo, instruindo-me do que suceder, e dando-me parte das medidas que se tiverem tomado em quaisquer circunstâncias.

Artigo IV. O Comandante de Lisboa assistirá ao Conselho.

Artigo V. Imprimir-se-á o presente decreto.

Lisboa, 15 de Agosto de 1808.

O Duque de Abrantes

Pelo Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor General em Chefe.

O Secretário Geral do Conselho do Governo, Lhoied [sic].


Spanish-Patriots attacking the French-Banditti. Loyal Britons lending a lift, caricatura de James Gillray (15 de Agosto de 1808)




Patriotas espanhóis atacando os bandidos franceses. Leais bretões dando uma ajuda.
Caricatura de James Gillray, publicada a 15 de Agosto de 1808.


Publicada no mesmo dia em que Napoleão festejou os seus 39 anos, esta gravura ricamente detalhada satiriza as primeiras derrotas dos exércitos franceses na Espanha, criticando ao mesmo tempo a defesa do Ancien Régime por parte dum exército atípico donde sobressaem monges, bispos, freiras, e homens e mulheres da nobreza espanhola.



Em primeiro plano, à esquerda, duas damas espanholas (uma das quais levando um punhal ensanguentado pendurado à cintura) transportam balas para a boca dum canhão que está a ser calcado com um soquete por um monge, enquanto um nobre prepara-se para lançar fogo à peça com um morrão. No canto inferior esquerdo encontram-se barris de pólvora britânica.





Ao centro, também em primeiro plano, encontram-se freiras que empunham crucifixos e punhais ensanguentados. Uma delas, mais corpulenta, pisa um soldado francês que agoniza no chão, ao mesmo tempo que está prestes a esfaquear outro francês que agarra pelos cabelos, o qual apresenta uma expressão aterrorizada. 



Em segundo plano, no lado esquerdo, sobressaem alguns homens a cavalo, com espadas ensanguentadas, liderados por um bispo (que segura o seu báculo numa mão e na outra uma espada, também ensanguentada) e por um monge gordo que toca uma trombeta para animar a multidão de soldados. Estes últimos estão todos armados com lanças e em formação cerrada, e portam bandeiras com inscrições para animar a hoste: Viva a Liberdade, Vitória Espanhola, Viva o Rei Fernando VII. Note-se que entre o bispo e o monge também se vê uma imagem da Virgem Santa, a qual segura o menino com uma mão e uma espada com a outra. É talvez este o quadro que melhor ilustra a unidade então tão proclamada entre a Pátria, a Religião e a Monarquia.





Os motivos religiosos repetem-se em todo o lado esquerdo da gravura. Ao fundo, aparecem várias pessoas cercando uma grande cruz que está sobre o topo duma montanha, enquanto um pouco mais abaixo a artilharia espanhola (com uma bandeira da Liberdade e Lealdade) abre fogo sobre os franceses.



No lado direito, também ao fundo, vê-se em pequena escala uma multidão de soldados franceses fugindo em debandada, deixando para trás mortos, armas, tambores... Nas suas bandeiras podem-se ler expressões como A morte ou a vitória, Viva o Rei José e Dupont. Para além do cenário montanhoso, a aparição do nome do General Dupont remete inevitavelmente para a batalha de Bailén (no sopé da Sierra Morena), suposto cenário da batalha aqui representada.




No lado direito, em primeiro plano, vê-se um granadeiro britânico a trespassar com a baioneta do seu mosquete a dois dos franceses horrorizados e grotescos que aparecem mais à direita. Na sua barretina estão inscritas as letras G.R., que correspondem à expressão latina George Rex (Rei Jorge). Devemos aqui fazer um parêntesis para sublinhar, em termos de rigor histórico, que o exército britânico não participou na batalha de Bailén (de facto, o exército britânico forneceu pólvora e munições aos espanhóis e o corpo de Spencer chegou a desembarcar no Puerto de Santa María, perto de Cádis, mas pouco depois voltou a embarcar com destino a Portugal, sem ter tido qualquer tipo de confronto contra os franceses durante essa curta estadia no território espanhol). Na verdade, as primeiras tropas britânicas que lutaram contra os franceses na Península foram as comandadas por Wellesley, num pequeno confronto travado a sul de Óbidos, travado precisamente no dia em que esta caricatura foi publicada.


Note-se finalmente que um dos pés do referido granadeiro britânico pisa a bandeira duma suposta Legião Invencível do Exército francês, cujo portador jaz decapitado no chão...

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