Quartel-General, Calvaria, 13 de Agosto de 1808.
O Tenente-Coronel Trant informou-me esta manhã acerca da aflição que as vossas tropas poderão estar prestes a sofrer devido à falta de pão, e instou-me seriamente, da parte de Vossa Excelência, para que o Comissariado britânico enviasse pão para as tropas portuguesas*. Devo pedir licença para recordar a Vossa Excelência que disse-vos repetidamente que não tinha poder para abastecer as tropas portuguesas com pão; e de facto, quando Vossa Excelência reflectir sobre a minha situação neste país, na remota esperança que Portugal iria a qualquer momento ver supridas as suas necessidades de pão pelas tropas britânicas, na distância a que estamos da Grã-Bretanha, donde devemos obter o nosso fornecimento de pão perante estas circunstâncias, e, acima de tudo, no facto de que não fiz quaisquer preparativos anteriores para responder a um pedido tão extraordinário da parte de Vossa Excelência, estou convencido que dar-me-eis a justiça de acreditardes que, ao declinar aquiescer com as vossas vontade sobre este assunto, sou levado a agir apenas tendo em conta estas circunstâncias, atendendo à nossa situação no momento presente, circunstâncias essas que podem ter uma influência fatal sobre o sucesso do serviço onde ambos nós estamos empregados. Peço licença para voltar a lembrar que disse a Vossa Excelência, no Porto, que não posso suprir pão às tropas portuguesas; que repeti-vos isto em Montemor-o-Velho e informei-vos nessas duas conferências que deveria pedir vinho e carne para os meus soldados, e palha e grãos para os cavalos e para o gado agregado ao Exército. Marchei para diante a toda a pressa, e com grandes inconvenientes para o Exército, de maneira a obter o depósito formado em Leiria, pois entendi que o mesmo era para o uso da tropas britânicas, mas quando ali cheguei, fui informado pelo Comissariado português que se ele entregasse o pão às minhas tropas, não haveria nenhum para aquelas que estão debaixo do comando de Vossa Excelência, e assim sendo, desisti de o pedir; e de facto nada recebi em Leiria, à excepção de vinho para um dia.
Estou realmente muito preocupado que as tropas de Vossa Excelência venham a sofrer algumas dificuldades; mas deveis estar consciente que não é sobre mim que devem recair os preparativos para abastecê-las; e que não pedi uma parte maior dos recursos do país (particularmente, não pedi pão), mas sim a necessária para as tropas de Sua Majestade [Britânica]; e confio que vereis que é apropriado adoptar alguns preparativos que permitam alimentar eficazmente o Exército que conduzireis para Lisboa; ao mesmo tempo que permitireis que as tropas de Sua Majestade [Britânica] desfrutem daqueles recursos do país que acima mencionei, os quais fazem-lhes falta.
Como agora é certo que o General Loison marchou de Tomar para Torres Novas, não vejo que possa resultar inconveniente algum em Vossa Excelência parar em Leiria hoje ou talvez amanhã; em cujo momento espero que tenhais tido o poder de fazer os preparativos que recomendei para os vossos abastecimentos.
Tenho a honra de ser, Senhor, o mais obediente e humilde servidor de Vossa Excelência.
Arthur Wellesley
[Fonte: Luís Henrique Pacheco Simões (org.), "Serie chronologica da correspondencia diplomatica militar mais importante do General Bernardim Freire de Andrade, Commandante em Chefe do Exercito Portuguez destinado ao resgate de Lisboa com a Junta Provisional do Governo Supremo estabelecido na cidade do Porto e o Quartel General do Exercito Auxiliar de S. Magestade Britanica em Portugal", in Boletim do Arquivo Histórico Militar - Vol. I, Lisboa, 1930, pp. 153-227, pp. 175-176 (doc. 13)].
_____________________________________________________________
Nota: