terça-feira, 31 de maio de 2011

A propaganda de Lagarde pró-napoleónica e anti-borbónica, segundo a Gazeta de Lisboa de 31 de Maio de 1808




[...]


[Fonte: Gazeta de Lisboa, n.º 22, 31 de Maio de 1808].


Notícia publicada na Gazeta de Lisboa sobre a nova organização do exército português enviado para a França, agora chamado Legião Portuguesa (31 de Maio de 1808)


Lisboa, 31 de Maio

[...] 

Assegura-se que as tropas portuguesas que se acham em caminho para a França, vão receber, por decreto de Sua Majestade o Imperador e Rei, uma nova organização que as assemelha quase às próprias tropas francesas. Devem tomar o nome de Legião Portuguesa, que será composta de 10 mil e tantos centenares de homens, comandada por um General de Divisão português e por três Generais de Brigada do mesmo país. Dizem que as particularidades desta reorganização se confiaram ao General de Divisão Muller. Parece que as ditas tropas se destinam para as guarnições da parte meridional da França, especialmente para as da 11.ª Divisão militar, cujo principal lugar é Bordéus.

[Fonte: Gazeta de Lisboa, n.º 22, 31 de Maio de 1808].


Uma Carta Americana sobre Lagarde e a Gazeta de Lisboa, contendo também uma exposição sobre a traição de Bonaparte em Bayonne



Plácido a Venâncio




Maio de 1808


Se eu analisasse todos os discursos do novo gazeteiro Lagarde, escreveria mui longas cartas. São contínuos os sermões indigestos que prega, e as exortações futilíssimas, com que intenta convencer-nos de que devemos esperar em tranquilidade que se convertam em bens os males que nos afligem. Que descarado embusteiro, meu amigo! Que baixo adulador! Que vil escravo! Contanto que prospere seu Senhor, nada lhe importa que o resto da espécie humana seja desgraçada. Vendido ao Déspota que aspira a reger o mundo com império absoluto, lida noite e dia para lhe aplanar a escabro a estrada; inverte a ordem e altera a verdade de factos conhecidos, compõe redacções fabulosas; encarece o poder e sabedoria do Tirano; elogia os indignos que se curvam ao ídolo, e vitupera os bons que não o acatam. Tem empenhado maiormente a sua retórica depois que principiou a descrever a entrada das tropas francesas em Espanha, e a prometer resultados felizes da estreita e, mais que nunca, sincera aliança dos dois Governos. As verdades que se podem esperar das imposturas são as seguintes: que Murat, tendo já passado os Pirenéus e afectando não querer entrar em Madrid sem estar de acordo com o Governo espanhol, entrou a 23 de Março com o protesto[=declaração] de marchar para Cádis; que o rei Carlos renunciou a coroa em seu filho Fernando (1); que o novo monarca, constando-lhe que o Imperador vinha às fronteiras, nomeou o Duque de Frías, o de Medinaceli e o Conde de Fernan-Nunes para o cumprimentarem em seu nome; e que escutando depois, como verdadeiros, homens de conhecida venalidade, resolveu encontrar-se com ele em Bayona, para onde passaram também a Rainha, Carlos IV e os Infantes; que o povo, menos crédulo que seus soberanos, desconfiando da pureza das intenções do Imperador, fez no dia 2 de Maio o primeiro ensaio de vingança; e que, finalmente, Bonaparte, tendo colhido a Família Real, a violentou a renunciar os direitos à Coroa de Espanha, com a qual pretende ornar a frente de seu irmão José.
O iniciado nos mistérios do novo Oráculo cuidou antecipadamente em nos preparar os ânimos para a grande revolução, admoestando-nos a adorar Napoleão, que já na China, diz ele, lhe chamam Raio da Luz de Tien, e em Constantinopla Sol e Estrela de Júpiter, e aconselhando-nos a que não tentemos sondar [os] seus altos segredos, porque chegando o tempo de saber o que o seu Génio prepara para a sorte e felicidade dos povos submetidos à sua influência, ele o proclama duma maneira tão nobre como ingénua (2). Falou depois vagamente de acusações recíprocas de Carlos IV e Fernando VII, e da anarquia inevitável da Espanha, se não fora Árbitro de tão extraordinária questão o Príncipe que, trazendo e havendo já dado e restituído tantas Coroas, exerce na Europa uma influência irresistível (3)
Tal foi a marcha dos discursos do impostor, enquanto não se cometeu a traição execranda que privou do trono de Espanha ao desgraçado Fernando VII; mas quando chegou o tempo de descobrir o atentado, anunciou que o rei Carlos declarara que só tinha abdicado para escapar às tramas da Corte e salvar a vida; que Fernando VII, sabendo da protestação do pai, lhe restituíra a coroa; e que, então, Carlos IV a renunciara no Imperador, assim como os Infantes os seus direitos para que elegesse a pessoa e dinastia que melhor julgasse; que a Família Real de Espanha passava ao interior da França, enquanto serenavam as discórdias; e que Murat governaria entretanto o Reino como Lugar-Tenente de Carlos IV (4).
Não podem, meu Venâncio, crescer as iniquidades, nem pode ser mais delgado o véu com que intentam encobri-las. Na opinião de Bonaparte, a Espanha compõe-se de mentecaptos dispostos a acreditar que se renunciam Estados como benefícios, e a respeitar decretos ditados pelos algozes que cercavam os seus soberanos. Não, vil traidor, elevado ao trono de Luís XVI para desgraça da Europa, os Espanhóis não ignoram que, ainda em completa liberdade, não pode o Rei transferir a outrem a Coroa que lhe deram os seus povos, e que seria inválida a renúncia, ainda que não fora arrancada por violência. Embora mande o indigno Murat (5) desarmar os cidadãos, queimar o lugar onde for morto um francês, responder o amo pelo criado, o pai pelo filho, o prelado pelo súbdito; embora clamem os assalariados de Lisboa e Madrid que o povo não pode resistir a tropas disciplinadas, e que será inevitável a guerra civil, se a Espanha não aceita o domínio francês. A Espanha prepara-se, não para a guerra civil, porque não pode havê-la levantando-se a nação inteira por uma só causa, mas para a da vingança que merece a violação escandalosa dos direitos exclusivos dos povos, e a perfídia atroz do monstro que a Córsega lançou sobre o continente para flagelo da humanidade. Os Reis que, mal aconselhados, preferiram a condição abjecta de tributários à nobre independência, instruídos agora pelos sucessos de Bayona, cuidarão em reparar a sua eminente desgraça; e a liga geral da Europa contra a nação altiva que a tem assolado mostrará aos perturbadores da nossa felicidade que tem sempre curta duração o Império do terror. 

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Notas:

(1) Em Aranjuez a 19 de Março de 1808.

(2) Gazeta de 6 de Maio de 1808. Se Lagarde entendia por maneira ingénua palavras claras, não nos enganou; porque Bonaparte, quando obrigou Fernando VII a renunciar, não usou de perífrase; renunciar ou morrer = bolsa ou vida, são modos de exprimir muito lacónicos e claros.


(4) A protestação de Carlos IV, as cartas das renúncias, etc., acham-se nas Gazetas de 20, 21, 27, 28 e 30 de Maio de 1808.



[Fonte: “Carta XLIX”, in Cartas Americanas. Publicadas por Theodoro José Biancardi [1.ª ed., 1809], Lisboa, Impressão de Alcobia, 1820, pp. 166-170. Inserimos os itálicos originais e as notas do autor]. 


segunda-feira, 30 de maio de 2011

Proclamação da Junta Suprema de Sevilha ao povo português (30 de Maio de 1808)




Portugueses!


A vossa sorte é talvez a mais dura que jamais sofreu povo algum sobre a terra. Os vossos Príncipes foram obrigados a deixar-vos, e os acontecimentos da Espanha são uma prova irrefragável da absoluta necessidade daquela medida. Vós tivestes ordem para não defender-vos; e, com efeito, não vos defendestes. Junot ofereceu fazer-vos felizes, e a vossa felicidade consistiu em serdes tratados com maior crueldade do aquela que os mais ferozes conquistadores irrogam aos povos que têm subjugado à força de armas, e depois da mais obstinada resistência. Vós tendes sido despojados dos vossos príncipes, das vossas leis, dos vossos costumes, da vossa propriedade, da vossa liberdade, até das vossas vidas, e da vossa Santa Religião, que os vossos inimigos jamais respeitaram, quaisquer que tenham sido (na forma de seu costume) as promessas que fizessem de a proteger; e por mais que afectem, e pretendam ter algum conhecimento dela. A vossa nobreza foi aniquilada; a sua propriedade confiscada, em castigo de sua fidelidade e lealdade. Vós tendes sido vilmente arrastados para os países estrangeiros, e sido obrigados a prostrar-vos aos pés daquele homem que é o autor das vossas calamidades, e que com a mais horrível perfídia usurpou o vosso Governo, e vos governa com um ceptro de ferro. Mesmo agora, que as tropas deixaram as vossas fronteiras, e viajam em cadeias para morrer em defesa daquele que vos tem oprimido, e por este meio poderá a sua profunda malignidade conseguir as suas vistas, destruindo aqueles que constituiriam a vossa fortaleza, e fazendo que as suas vidas sejam instrumento de seus triunfos, e da glória selvagem a que ele aspira.
A Espanha viu a vossa escravidão e os horrorosos males que se lhe seguiram, com a duplicada sensação de dor e desesperação. Vós sois olhados como irmãos, e a Espanha arde por voar em vosso socorro. Mas certos chefes, e um Governo fraco e corrompido, a retiveram em cadeias, e continuaram a preparar os meios pelos quais a ruína do nosso rei, das nossas leis, da nossa independência, nossa liberdade, nossas vidas, e até da nossa Santa Religião, em que estamos unidos, deveria acompanhar a vossa ruína, pela qual um povo bárbaro poderia consumar o seu triunfo, e completar a escravidão de todas as nações da Europa. A nossa lealdade, a nossa honra, a nossa justiça, não se podiam submeter a tão flagrante atrocidade! Nós quebrámos as nossas cadeias – entremos, por tanto, em acção – nós temos exércitos, nós temos chefes, a voz geral da Espanha é: Morreremos em defesa da nossa Pátria, mas teremos cuidado de que morram também connosco aqueles infames inimigos. Vinde, pois, generosos portugueses, uni-vos com a Espanha para morrer em defesa da vossa Pátria – as suas bandeiras vos esperam, eles vos receberão como irmãos infamemente oprimidos. A causa de Espanha e de Portugal é a mesma, não deixeis de confiar nas nossas tropas, os seus desejos são os vossos mesmos, e podeis contar com a sua coragem e fortaleza, como parte da vossa segurança.
Vós tendes entre vós mesmos o objecto da vossa vingança – não obedeçais aos autores da vossa desgraça – atacai-os – eles não são mais do que um punhado de miseráveis homens, aterrados com um terror pânico, humilhados, e conquistados já pela pérfida e crueldades que têm cometido, e que os têm coberto de opróbrio aos olhos da Europa e do Mundo! Levantai-vos portanto num corpo, mas evitai o manchar com crimes vossas mãos honradas; porque o vosso fim é resistir-lhes e destruí-los – os nossos esforços unidos serão bastantes para esta nação pérfida, e Portugal, Espanha, toda a Europa, respirará ou morrerá livre, e como homens.
Portugueses: A vossa Pátria já não está em perigo – este já passou – uni-vos, uni-vos, e voai a restabelecê-la e a salvá-la.
Sevilha, 30 de Maio de 1808. Por ordem da Suprema Junta do Governo.

D. Juan Bautista Esteller, 1.º Sec.
D. Juan Bautista Pardo, 2.º Sec.

[Fonte: Joaquim José Pereira de Freitas, Biblioteca Histórica, Política e Diplomática da Nação Portuguesa, ed. cit., pp. 136-138; José Acúrsio das Neves, História Geral da Invasão dos Franceses em Portugal – Tomo III, ed. cit., pp., pp. 27-32; Correio Braziliense – Armazém Literário (Julho de 1808), ed. cit., pp. 138-140; Gazeta Extraordinária do Rio de Janeiro, n.º 1, 14 de Setembro de 1808, pp. 3-4; Simão José da Luz Soriano, História da Guerra Civil e do Estabelecimento do Governo Parlamentar em Portugal. Compreendendo a História Diplomática, Militar e Política deste Reino, desde 1777 até 1834 – Segunda Época - Tomo V – Parte I, Lisboa, Imprensa Nacional, 1893, pp. 52-54. Na sua língua original, esta proclamação pode ser encontrada, por exemplo, na Coleccion de bandos, proclamas y decretos de la Junta Suprema de Sevilla, y otros papeles curiosos reimpreso em Cádiz por D. Manuel Santiago de Quitana, Cádiz, s.d. [1808?], pp. 14-15; na Gazeta Ministerial de Sevilla, n.º 2, en la Imprenta de la viuda de Hidalgo y Sobrino, 4 de junio de 1808, pp. 13-15; ou no Diario Mercantil de Cadiz, n.º 176, 22 de junio de 1808, pp. 689-691].


domingo, 29 de maio de 2011

Instruções da Suprema Junta do Governo de Sevilha (29 de Maio de 1808)




[Fonte: Correio Braziliense, n.º 8, Janeiro de 1809, pp. 19-20].

Resposta do Bispo da diocese galega de Orense à Junta do Governo Espanhol, acerca da sua nomeação para fazer parte da Junta de Bayona (29 de Maio de 1808)


Acta de vereação da Câmara da vila de Ançã (29 de Maio de 1808)




Apesar de ir contra os interesses de Junot, o pedido de uma constituição para Portugal rapidamente correu o país. Logo no dia 29 de Maio de 1808, os membros da Câmara da vila de Ançã reuniram-se com alguns nobres e populares para ser lida a carta da deputação portuguesa e para seguidamente se assinar uma resposta a Junot. Como se poderá ver através da acta da vereação desse dia, que abaixo se publica, esta resposta pouco diferia do referido pedido de constituição:



Ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1808, aos 29 dias do mês de Maio do dito ano, nesta vila de Ançã e casas da Câmara dela, onde eu escrivão vim com o dr. Juiz de Fora desta mesma vila, o dr. Bento Pereira do Carmo, como também os [de]mais oficiais da Câmara ao diante assinados, e bem assim com as pessoas mais distintas dentre a nobreza e povo desta vila e seu termo, e aí, perante todos, depois dele ministro ter lido a carta que de Bayona, em data de 27 de Abril, os deputados portugueses dirigiram aos seus concidadãos, recitou o seguinte discurso: 

Senhores: Haveis acabado de ouvir na carta dos deputados deste reino as promessas da vossa felicidade, feitas e afiançadas em nome do Augusto Imperador que nos governa: seremos uma nação independente, conservaremos o nosso carácter nacional, avivado pelo vigor e sabedoria de Napoleão o Grande. Tal é a dita que o venturoso futuro oferece aos portugueses; mas para virem a efeito tão solenes promessas, é mister todavia que os nossos concidadãos se tornem dignos delas. 
É mister depor todos os prejuízos, ou filhos da educação ou do antigo sistema do governo; é mister que, animados do mesmo espírito, nos unamos todos a nossos irmãos, à grande família europeia. 
Já não há Pirenéus, dizia um rei de França no começo do século passado, quando seu neto vinha ocupar o trono de Espanha. Nós com maior razão diremos agora [que] já não há barreiras que separem um povo de outro povo. Cessarão já duma vez os ódios e antipatias nacionais, pois que o génio imortal do grande Napoleão tem afastado todos os tropeços, ou levantados pela nobreza, ou nascidos de preocupações vulgares. 
Os franceses, italianos, portugueses, espanhóis e napolitanos, não formam daqui em diante mais do que uma grande família de irmãos, regida por um sistema uniforme e luminoso. 
Este sistema organizado por Sua Majestade Imperial e Real, posto em efeito por ele e sua augusta dinastia, tem por fim a felicidade geral do continente, que é o resultado da felicidade individual das famílias.
Não tardarão a luzir na Europa os dias de ouro, apenas sonhados por nossos avós, em que, à sombra duma paz permanente, possam as nações entregar-se com porfia aos trabalhos de agricultura, da indústria e do comércio; dias em que todo o indivíduo sentirá em cada momento da sua existência a felicidade de viver debaixo do poder de Napoleão o Grande. 
Eu vos convido, senhores, a que deis as devidas demonstrações de júbilo por tão lisonjeiras esperanças; mas devemo-lo fazer de uma maneira digna do soberano e da nação. O Imperador é um pai que, no meio das mais ternas efusões do coração, escuta com bondade os brados de seus filhos; na qualidade de pai receberá com benevolência os nossos singelos agradecimentos e também as nossas súplicas; e na qualidade do maior monarca, do mais poderoso imperador do Universo, fará sem dúvida tudo quanto for a bem da nossa prosperidade. 

E logo findo que foi este discurso, assentaram ele ministro, e [de]mais oficiais da Câmara e pessoas distintas que assistiram à sessão, abaixo assinadas, que se dirigisse ao nosso Augusto Soberano, por via do Il.mo e Ex.mo Sr. duque de Abrantes, que tão digno se tem feito do amor dos portugueses, a seguinte representação:


REPRESENTAÇÃO


Senhor! A Câmara da vila de Ançã, como representante de oito mil de seus concidadãos, vai aos pés do elevado trono de Vossa Majestade Imperial e Real agradecer-lhe com expressões filhas do amor e admiração, os altos benefícios com que a bondade de Vossa Majestade Imperial e Real quer beneficiar os portugueses. 
A Câmara, Senhor, conhece que todos nós somos de origem francesa; que a uma princesa francesa é que devemos a nossa organização política, que tem durado por espaço de 700 anos; que à nação francesa é que somos devedores ainda do reconhecimento da nossa liberdade, na memorável época de 1640; finalmente conhece a Câmara que Vossa Majestade Imperial e Real acaba de sacudir o vergonhoso jugo que há muitos anos fazia gemer em segredo os amigos da pátria, sendo reduzida a colónia dos eternos inimigos do continente; uma nação que, nos dias brilhantes da sua prosperidade, foi reconhecida por mestra do comércio e marinha dos europeus. 
Nós pretendemos ser mais do que então fomos, Senhor, e é por isso que imploramos a Vossa Majestade Imperial e Real a mui distinta mercê de nos conceder um soberano de Sua Imperial Família, e uma Constituição que seja em tudo semelhante à que Vossa Majestade Imperial e Real houve por bem dar ao ducado de Varsóvia, alterando-se unicamente o modo de eleger os representantes nacionais, que entre nós parece que deve ser pelas Câmaras, para melhor se conformar com os nossos antigos costumes.
Queremos uma Constituição em que, bem como na Varsóvia, a religião do estado seja a católica apostólica romana, protestando pela admissão de todos os princípios da última concordata do império francês com a Sé Romana, sendo porém tolerados todos os cultos;
Uma Constituição, Senhor, em que todos os cidadãos sejam iguais ante a lei, e em que o nosso território europeu seja dividido em oito ou mais departamentos, regulando-se por esta divisão civil a eclesiástica;
Uma constituição em que haja no Ministério um ministro encarregado da instrução pública, e em que se estabeleça a liberdade de imprensa, como no império francês, porque a ignorância e o erro causaram a nossa decadência;
Uma Constituição em que o poder executivo deva instruir-se por um Conselho de Estado, e sejam seus decretos cumpridos por ministros que fiquem responsáveis pela sua execução, e em que a ordem judiciaria fique independente, e julgue pelo Código de Napoleão;
Uma Constituição em que os funcionários públicos sejam os mais beneméritos dentre os nacionais, como se determina no titulo 11.° da Constituição Polaca, e que chegando-se a organizar e reduzir os corpos da administração civil, económica e judiciária, como é de interesse público, fiquem os demitidos conservando vitaliciamente os seus ordenados, relativos aos cargos oficiais ou benefícios de que forem destituídos, e que vagando qualquer emprego, lhe seja dado com preferência, se tiverem merecimentos e costumes;
Uma Constituição, finalmente, em que os bens dos corpos de mão-morta, adquiridos contra o interesse nacional, e lei destes reinos desde a lei do Sr. D. Diniz de 21 de Março de 1291, voltem todos à circulação; em que a distribuição dos impostos seja proporcionada aos haveres de cada individuo, sem que algum fique isento de pagá-los, procurando-se que a sua arrecadação seja mais fácil e suave e em que a divida anterior do Estado seja concedida e garantida.
Senhor, estes são os nossos desejos. Vossa Majestade Imperial e Real não verá na declaração sincera dos nossos sentimentos senão a confiança ilimitada que temos, bem como toda a nação na magnanimidade do Árbitro da Europa. O seu nome, Senhor, viverá nos nossos corações, e nos corações de nossos filhos até à derradeira posteridade, e nós não cessaremos de clamar no seio de nossas famílias Viva Napoleão o GrandeViva a sua Augusta Dinastia.

E desta sorte houveram este auto por feito e acabado, que ele ministro, oficiais da Câmara e nobreza aqui assinaram. 
E eu, Manuel Pedro d'Almeida, escrivão da Câmara o escrevi e assino.  
Manoel Pedro d'Almeida 
O Juiz de Fora, Bento Pereira do Carmo
O Vereador mais velho, António dos Reis Camelo
O Vereador, Francisco da Silva Lobato Cortezão
O terceiro Vereador, Francisco Bernardo da Costa Freire
O Procurador da Câmara, José Rodrigues
Francisco d'Abreu Pereira Coutinho, Prior
José de Gouveia d'Almeida Beltrão
Luiz Beltrão de Gouveia e Lucena
António José Valério
José Angelo Saraiva de Carvalho
Francisco de Paula e Oliveira
Joaquim José Colaço Brandão
Christovão Lopes Cerveira. 
 
[Fonte: "Celebre representação da Camara de Ançã", in Francisco Augusto Martins de Carvalho, Guerra Peninsular - Notas, Episodios e Extractos Curiosos, Coimbra, Typographia Auxiliar d'Esciptorio, 1910, pp. 39-42].

Relatório de Lagarde sobre o estado de ânimos no Algarve à data de 29 de Maio de 1808



Boletim n.º 27

Lisboa, 3 de Junho de 1808

[...]

Algarves - O Corregedor mor, 29 de Maio


O Corregedor mor dos Algarves [Mr. Goguet] informou-me, em data de 29 de Maio, que a redução da contribuição de guerra excitou a mais viva alegria nesta província. 
Ele acrescenta que os algarvios não ignoram que este benefício deve-se ao interesse de Vossa Excelência por este país; e que eles estão cheios de gratidão.  
[...]

[Fonte: António Ferrão, A 1ª invasão francesa : a invasão de Junot vista através dos documentos da Intendência Geral da Polícia, 1807-1808: estudo politico e social, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1923, pp. 385.-391, pp. 389-390. Tradução nossa do texto original em francês].


sábado, 28 de maio de 2011

Aviso publicado na Gazeta de Lisboa de 28 de Maio de 1808z



[Fonte: 2.º Supplemento à Gazeta de Lisboa, n.º 21, 28 de Maio de 1808].

Acta de vereação da Câmara de Faro (28 de Maio de 1808)


Nesta mesma [vereação] foi apresentado o Decreto do Ex.mo Duque de Abrantes, General em Chefe deste Reino, para que mandem imprimir a fala que fizera a Deputação Portuguesa a Sua Majestade Imperial e Real [Napoleão], nomeada[=remetida] aos compatriotas para que a mesma se fizesse pública, como assim já se acha cumprido [n]esta cidade e agora este Senado a manda registar para todo o tempo constar o seu conteúdo.

[Fonte: Arquivo Histórico Militar, 1.ª div., 14.ª sec., cx. 186, doc. 24].

Notícias publicadas na Gazeta de Lisboa (28 de Maio de 1808)



Lisboa, 28 de Maio.


A exemplo da cidade de Coimbra, pediram Leiria, Amarante, Castelo-Branco, Ricardães e várias outras povoações licença aos seus Magistrados para pôr luminárias, por três dias, em sinal de regozijo das intenções tão cheias de benevolência que a Deputação portuguesa transmitiu aos seus concidadãos, em nome de Sua Majestade o Imperador e Rei. Em Amarante, [a]demais disso, se cantou o Te Deum, para dar graças ao Céu pela certeza que tinha este Reino de conservar a sua independência debaixo da protecção tutelar do Grande Napoleão*.

O clero portugués tomou vivamente parte neste movimento de entusiasmo geral. Entre os prelados que publicaram a este respeito pastorais tão conformes ao espírito da Religião como ao interesse do Estado, merecem ser citados os Excelentíssimos Bispos do Porto, do Algarve e de Aveiro; como também o Muito Reverendo Vigário Geral que governa a diocese de Coimbra, na ausência do Bispo, membro da Deputação portuguesa.

A cidade do Porto também manifestou a mais viva alegria à nova dos benefícios de que Sua Majestade já deu um tão belo penhor a Portugal. O Tribunal da Relação daquela cidade, que é o segundo Parlamento do Reino, formalmente encarregou os deputados que tinha já em Lisboa de se apresentarem em seu nome ao Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Duque de Abrantes, querendo dar um novo testemunho do respeito que professa à Religião, declarou que a procissão do Corpo de Deus, que é uma das mais brilhantes solenidades de Lisboa e que oferece nesta cidade o mais magnífico espectáculo, se faria este ano como de costume. Conseguintemente, as ruas por onde há de passar se deverão armar com a mesma pompa. Segundo as intenções de Sua Excelência, o Senhor Conselheiro do Governo, Intendente Geral da Policia do Reino [Lagarde], já deu as ordens necessárias para que as ditas ruas se reparassem e calçassem de novo. 


A 12 deste mês, toda a família que cessou de reinar em Espanha saiu de Bayonne, para ir à sua destinação, no interior da França. Por todo o seu caminho se faziam as maiores honras ao antigo Rei e à Rainha Luísa, os quais se dirigiam a Fontainebleau, magnífica casa de campo Real, sita 20 léguas de Paris, onde o próprio Imperador passou uma parte do Verão precedente; e deviam ali residir, até que a casa de campo de Compiegne, que se lhes destina, se tenha posto em estado de os receber. Os bosques assim de Fontainebleau, como de Compiege, são famosos para a caça; e El-Rei Carlos IV poderá aí entregar-se a este recreio que tem sempre sido a paixão dominante da sua vida. Os Grandes de Espanha e todos os corpos civis e militares do Estado tiveram a honra de ser apresentados com o ceremonial de costume a Sua Alteza Imperial o Grão-Duque de Berg, para dar-lhe o parabém da sua exaltação à dignidade de Lugar-Tenente Geral do Reino. Sua Alteza os recebeu com aquele agrado que lhe ganha os corações, respondendo-lhes com a afabilidade que o distingue.


Os ingleses mostram cada vez mais até que ponto é sincera a afeição que têm ao Príncipe do Brasil! Depois de lhe terem feito perder os seus Estados da Europa a preço da sua aliança, e tomado a ilha da Madeira, deram ordem ao Governador de Bombaim para que se apoderasse do estabelecimento português de Goa. Assim é que socorrem os que caem no desatino de se sacrificar por eles.


[Fonte: 2.º Supplemento à Gazeta de Lisboa, n.º 21, 28 de Maio de 1808].



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* Note-se como a última frase deste primeiro parágrafo foi manipulada na tradução espanhola desta notícia, publicada na Gazeta de Madrid: "En Amarante se cantó el Te Deum, y se dirigieron al cielo los votos mas fervorosos por la conservación de Napoleon el grande" (trad: Em Amarante cantou-se o Te Deum e dirigiram-se aos céus os votos mais fervorosos pela conservação de Napoleão o grande) [Cf. Gazeta de Madrid, n.º 72, 30 de junio de 1808, pp. 688-689]. 

Carta de Geoffroy Saint-Hilaire a Cuvier, Director do Museu de História Natural de Paris (28 de Maio de 1808)




Lisboa, 28 de Maio [de 1808].

Meu caro amigo:

Procedi à escolha dos répteis e dos peixes; os répteis são muito abundantes em indivíduos, mas não em espécies. Existem apenas duas espécies de crocodilos*, ambas da vossa divisão dos caimões, sendo uma nova do Brasil e a outra de uma das vossas espécies com pálpebras ossificadas. Vós as tereis, assim como um esqueleto da primeira, proveniente dum indivíduo de maior tamanho**.
Os peixes são de uma riqueza que vos fascinará, sobretudo a família dos siluros.
Frei Veloso, sobre o qual o Sr. Correia me tinha falado, produziu imensos trabalhos de história natural, e não estou a exagerar quando digo isto. Ele foi responsável por iniciar uma descrição das produções do Brasil e ensinou desenho a muitos brasileiros, que, sob a sua direcção, desenharam [as ditas produções] muito bem, segundo as vistas dos naturalistas; estão aqui muitas dessas colecções. Vandelli, inimigo do frade, tem-nas à sua disposição. Frei Veloso ainda é vivo, e deram-lhe aqui uma pensão bem merecida; encorajaram-no então a publicar, mas ele não se encontra em estado de o fazer. Foi já tarde quando ele pensou em ser naturalista; para obedecer ao ministro, foi a Veneza para obter gravuras, e regressou com 300 caixas de pranchas gravadas relativas a plantas, etc.
Ireis ter as produções do Brasil, mas muitas vezes tereis dificuldades em relação ao clima correspondente a cada objecto, porque raramente aparece indicado nas etiquetas: as colecções de desenhos de Veloso resolveriam este problema. É assim muito importante que tenhais estes objectos; mas poder-se-ão arrancar essas pranchas a um homem tão invulgar?
É possível, dado que ele as cedeu ao Príncipe [D. João] e que já não estão nas suas mãos. Já submeti ao General em Chefe [Junot] esta questão delicada, o qual, por sua vez, confiou-a ao meu tacto. Verei o Padre Veloso e darei o meu melhor para conciliar os interesses da ciência e da honra.
Decidi o diferendo entre Vandelli e o Sr. Sieber***, e espero bem que não me acusem de apenas ter dado restos a cada parte; ambos estiveram de acordo comigo. 
O Sr. conde de Hoffmansegg tinha obtido permissão para expedir [as suas caixas] na condição de dar os seus duplicados ao gabinete da Ajuda; a condição foi esquivada em relação à grande maioria das caixas, enviadas directamente para o Báltico. Duas foram apreendidas na alfândega [de Lisboa] e ficaram retidas como garantia da palavra e dos compromissos do Sr. Hoffmansegg; decidi que os dois caixotes seriam restituídos com a condição de que o Sr. Sieber daria duplicados destas caixas ou das seis que tem na sua casa: obterei esses duplicados; ainda não os tenho, mas ao menos o Sr. Hoffmansegg não ficará privado de nenhuma peça única e terá 49 duplicados dos 50 que lhe foram destinados.
[...]
Adeus, abraço-vos com todo o coração. Para sempre todo vosso,


Geoffroy Saint-Hilaire.

[P.S.] Fazei-me o favor de comunicardes ao Instituto aqueles parágrafos das minhas cartas que sejam do seu interesse, para que não fique esquecido nesse lugar. 
Nos relatórios que transmito ao ministro sobre as minhas despesas, não posso entrar nos mesmos detalhes que vos relato: desejo que queirais aproveitar o envio da minha folha de despesas de viagem para lhe apresentardes um relatório sobre tudo o que vos informei.


[Fonte: E.-T. Hamy, "La mission de Geoffroy Saint-Hilaire en Espagne et en Portugal (1808). Histoire et documents", in Nouvelles Archives du Muséum d'Histoire Naturelle, Quatrième série - Tome dixième, Paris, Masson et C. Éditeurs, 1908, pp. 1-66, pp. 48-49].


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Notas: 


* Já depois ter escrito esta carta, Geoffroy Saint-Hilaire teve conhecimento que existiam exemplares de outras duas espécies destes animais em Lisboa, pelo que anotou a este respeito seguinte post-scriptum: "Há aqui, muito seguramente, quatro espécies da vossa divisão de caimões, todas do Brasil. Acabo de ver mais duas num depósito que ainda não tinha visitado. Disponho de exemplares de cada espécie com idades diversas, e podeis contar com este resultado [ou seja, o seu transporte para a França]. Lamento não ter a vossa memória à vista. Por aqui possuem os Annales só até o 8.º volume [publicado em 1806]. Poderia ter-vos descrito os caracteres desses crocodilos diferentes dos das espécies de que já dispondes, mas não ireis perder nada, pois ficareis com todos esses animais". [N.B.: Saint-Hilaire alude ao artigo de Cuvier intitulado Mémoire sur les différentes espèces de crocodiles vivans et sur leurs caractères distinctifs", in Annales du Muséum d'Histoire Naturelle - Tome dixième, Paris, Chez Tourneisen fils, 1807, pp. 8-66].

** Segundo o editor do artigo onde a carta acima traduzida apareceu originalmente publicada, o primeiro parágrafo do manuscrito consultado continha "muitas palavras ilegíveis".

*** Sieber era o agente que Hoffmansegg enviou ao Brasil, sobre o qual já adiantámos alguns dados nas nossas anotações à carta do General Margaron a Geoffroy Saint-Hilaire datada de 10 de Dezembro de 1807.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Avisos publicados na Gazeta de Lisboa de 27 de Maio de 1808



[Fonte: Suplemento Extraordinário à Gazeta de Lisboa, n.º 21, 27 de Maio de 1808].

Acta de vereação da Câmara de Penafiel (27 de Maio de 1808)





Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e oito aos vinte e sete de Maio, nesta cidade de Penafiel e casas da Câmara dela, onde foi o doutor corregedor e provedor desta cidade e comarca José Vaz Pereira Pinto Guedes e o doutor juiz de fora desta mesma Bento José de Macedo Araújo e Castro com os vereadores actuais, o licenciado Manuel Caetano Moreira, o licenciado Bernardo José de Azevedo e Mello e o licenciado João Bernardino Pinto de Moura, vereador de uma das pautas passadas, e o actual procurador António Joaquim de Carvalho, e com assistência da nobreza e povo desta mesma cidade. E aí com o maior respeito e demonstrações de sincero contentamento se publicou e leu o primeiro suplemento à Gazeta de Lisboa n.º 20, e unindo todos os seus votos, o seu reconhecimento e a sua mais submissa obediência à Augusta e Imperial beneficência e inapreciáveis virtudes de Sua Majestade Imperial e Real o Grande Napoleão primeiro, nosso magnifíssimo protector, árbitro e soberano, a quem renderam infinitas graças em sinal da sua pública gratidão e reconhecimento aos inumeráveis benefícios que havemos recebido e firmemente esperamos receber da Augusta [...] e incomparável [...] de Sua Majestade Imperial e Real, mediante a protecção de Sua Excelência o Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Duque de Abrantes, que tão heróica e paternalmente se interessa na sólida felicidade deste venturoso Reino. E para constar no referido mandaram fazer este auto que assinaram, e nobreza e povo. E eu, João Bernardo Telles de Menezes, escrivão proprietário da Câmara, o escrevi.

José Vaz Pereira Pinto Guedes.

[seguiam-se as assinaturas]



[Fonte: José Viriato Capela, Henrique Matos e Rogério Borralheiro, O Heróico Patriotismo das províncias do Norte. Os concelhos na Restauração de Portugal de 1808, Braga, Casa Museu de Monção/Universidade do Minho, 2008, p. 409].


Notícias publicadas na Gazeta de Lisboa (27 de Maio de 1808)




Lisboa, 27 de Maio.


Estamos autorizados para renunciar que Sua Majestade o Imperador e Rei, para dar a Portugal uma nova prova da mais alta benevolência com que honra este país, se dignou de reduzir a vinte milhões de cruzados em dinheiro a contribuição extraordinária que se fixara ao princípio em 40 milhões de cruzados.
A diminuição da metade deste imposto é de todo em proveito dos particulares; reservando-se Sua Majestade indemnizar consecutivamente ao Erário esta falta de arrecadação por um modo que não será de sorte alguma pesado às propriedades individuais. 
Esta venturosa nova vai a pôr o remate ao reconhecimento de que todos os corações portugueses estão já cheio para com Sua Majestade o Imperador e Rei. Deve-se também muito, numa tal circunstância, ao ardor com que se tem interessado por este país o Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Duque de Abrantes.
Cumpre ao mesmo tempo fazer notar que seria dar mostras de merecer tão pouco este grande benefício de Sua Majestade, como todos os que destina a este país, o não procurar com um novo zelo pagar, nas épocas indicadas, a parte restante da contribuição que por isso mesmo vem a ser uma dívida mais sagrada.
Conformemente à autorização de Sua Excelência o Duque de Abrantes, a Junta dos Três Estados se reuniu os dias passados para preparar e coordenar, de concerto com os Deputados dos grandes Corpos do Reino, a memória de agradecimentos destinada a Sua Majestade o Imperador e Rei da parte de Portugal; a memória já se acha assinada
A sobredita Junta foi instítuida e organizada nas Cortes de 1641, e entrou no exercício das suas funções por ordem de El-Rei D. João IV, no ano de 1643; é reputada por uma espécie de comissão das próprias Cortes.
Os mesmos votos e as mesmas felicitações continuam a ressoar em todas as partes do Reino, donde chegam a Lisboa. 

Segundo cartas de Espanha, era de esperar que se proclamasse, de um dia para outro, em Madrid, o novo Rei a favor do qual Sua Majestade o Imperador Napoleão dispõe do trono espanhol a que renunciou toda a família dos Bourbons repulsada por uma força de opinião que nunca lhe haveria permitido consolidar a tranquilidade num país onde o escândalo das suas discórdias excitou as paixões as mais ardentes. A não ser o partido adoptado a este respeito, estava a Espanha para vir a ser a presa de uma horrível guerra civil de que os próprios Bourbons haveriam sido as vítimas, por serem tão incapazes de impedi-la como de sufocá-la.

Pelos últimos mapas oficialmente publicados em França, se vê que o número dos indivíduos ali vacinados, durante os anos de 1806 e 1807, foi de seiscentos mil. Quantos infelizes não se livram assim dos estragos das bexigas e da morte por uma operação tão simples e tão fácil como a de uma picada de alfinete! Seria muito para desejar que os médicos portugueses se entendessem entre si para espalhar mais entre nós este venturoso método, ajudando nisso os intuitos do novo Governo. Seria também digno do nosso Clero o contribuir, pela influência que tem no ânimo da multidão, para vencer as preocupações contrárias à vacina, persuadindo aos pais que eles são culpados, aos olhos assim da Religião como da sociedade, quando se descuidam de um meio tão seguro de preservar os seus filhos de uma das moléstias as mais perniciosas à espécie humana


[Fonte: Suplemento Extraordinário à Gazeta de Lisboa, n.º 21, 27 de Maio de 1808].