domingo, 28 de agosto de 2011

Carta do Major Aires Pinto de Sousa ao General Bernardim Freire de Andrade (28 de Agosto de 1808)



Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor: 

Depois de jantar com efeito tive com o General Dalrymple a conferência que me havia anunciado esta manhã, e o resultado dela foi que ele entendia ser muito mais conveniente para os desígnios comuns que o corpo português, em lugar de obrar do lado de Alenquer e Beira-Tejo, obrasse do lado de Mafra, em razão de que os esforços dos franceses daquele lado não se podiam supor tão violentos e consequentes como de qualquer outro lado; que ele, General inglês, desejava marchar ele mesmo mais vizinho ao Tejo, talvez por Bucelas e Santo António do Tojal, e a ponto de poder cortar o passo mais essencial que podiam dar os inimigos para romper sobre as províncias; eu como conheci que 
Vossa Excelência desejava seguir o caminho de Alenquer, ainda instei; porém, o General inglês disse-me claramente que ele de forma alguma queria expor as forças portuguesas a ficar esmagadas, e que decerto os franceses mais naturalmente buscariam o caminho do Tejo do que o de Mafra, e que ele queria antes suster o maior esforço do inimigo; não tem dúvida que o corpo do Trant se reúna à nossa no ponto da Encarnação, aonde desejam que Vossa Excelência e o Exército se ache amanhã de tarde; sem contudo passar avante até ser quebrado o armistício, o que só pode saber-se amanhã ao meio-dia; entendo mesmo que nos querem unir uma Brigada alemã para nos apoiar; desejam que o corpo de Bacelar se ponha pronto a marchar para tomar, imediatamente que lhe for [dado] aviso, a marcha direita sobre Lisboa, até mesmo fazendo juntar o maior número de barcos possível para poder chegar a combinar-se a tempo com os movimentos dos ingleses pelo lado de Sacavém; finalmente, a nota inclusa dará uma clara ideia de todos estes movimentos. Desejam que Vossa Excelência deixe alguém para suster a guarnição de Peniche; finalmente, o General dá todos os entenderes de que deseja muito que Vossa Excelência e um corpo de tropas portuguesas possa entrar combinado com ele em Lisboa, quando Deus quiser que lá entremos, e por isso reputa o caminho por Mafra também conveniente; desejam saber o que achou a respeito de caminhos o nosso Quartel-Mestre-General Luís Gomes. Eis [que] aqui tem Vossa Excelência o que pude coligir de uma assaz larga conferência, e contudo se o meu voto é de algum peso assento que para a nossa segurança militar melhor à borda-mar que à beira do Tejo. 
Deus guarde a Vossa Excelência.
Agosto, vinte e oito, às seis da tarde.

De Vossa Excelência súbdito o atento,
Aires Pinto de Sousa.

[Fonte: Luís Henrique Pacheco Simões (org.), "Serie chronologica da correspondencia diplomatica militar mais importante do General Bernardim Freire de Andrade, Commandante em Chefe do Exercito Portuguez destinado ao resgate de Lisboa com a Junta Provisional do Governo Supremo estabelecido na cidade do Porto e o Quartel General do Exercito Auxiliar de S. Magestade Britanica em Portugal", in Boletim do Arquivo Histórico Militar - Vol. I, Lisboa, 1930, pp. 153-227, pp. 215-216 (doc. 44)].