Pelo ofício de Vossa Senhoria de 21 do corrente mês, vejo que se apoderou dessa praça [de Juromenha], em consequência das acertadas providência que tomou Vossa Senhoria; e sendo muito conveniente que se mantenha nela com a tropa do seu mando, espero que Vossa Senhoria, com o seu acreditado zelo e amor ao nosso Soberano, tomará todas as medidas oportunas para se suster nesse ponto enquanto for possível; e no caso de que as circunstâncias exijam que o abandone, procurará fazer a retirada com a precaução correspondente, em cujo caso pedirá auxílio à praça de Olivença, para que possa executá-la com a maior segurança, sendo muito importante que com antecedência tenha prevenido tudo o que for conveniente para transportar as armas, artilharia e os demais efeitos que indica nos relatórios que me enviou; e, se não puder transportar os canhões, deixe-os inutilizados, tal como os seus trens. Devo ainda advertir a Vossa Senhoria para que previna o Governador da praça de Olivença a fim de estar atento aos movimentos que os inimigos possam executar nestas imediações, para acudir a auxiliar Vossa Senhoria prontamente, por quantos meios lhe sejam possíveis.
Esta Junta Suprema fica satisfeita do zelo de Vossa Senhoria e do acerto com que se manejou nesta empresa, e pelo mesmo motivo aprovou e agradece a Vossa Senhoria através do meu conduto, esperando que continuará com o mesmo zelo na conservação desse ponto.
Deus guarde a Vossa Senhoria muitos anos.
Badajoz, 22 de Junho de 1808.
José Galluzo
[Fonte: Contestacion del Brigadier Don Federico Moretti y Cascone, (en la parte que le toca) al Manifiesto del Teniente General D. Juan Carrafa, Cadiz, Imprenta de Don Jose Maria guerrero, 1812, p. 23 (doc. 17)].
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Nota:
O primeiro levantamento popular alentejano ocorreu no dia 19 de Junho de 1808, quando o povo de Vila Viçosa investiu sobre o destacamento francês que ali se encontrava, o qual se viu obrigado a encerrar-se no castelo da localidade. Esta acção, bastante arriscada (dado que entre Elvas e Estremoz, ambas a pouca distância, encontravam-se pelo menos uns 6.000 franceses, comandados pelos Generais Kellermann e Avril), foi logo abafada no dia seguinte, através do envio de mais de 2.000 franceses sob o mando do próprio General Avril, que dominaram a insubmissão e saquearam a vila durante uma hora, morrendo na contenda cerca de 26 portugueses e 36 franceses, segundo as crónicas portuguesas (o Boletim n.º 1 do exército francês mostra uma outra versão).
Entretanto, logo na noite de 19 de Junho tinham partido dois deputados de Vila Viçosa em direcção a Badajoz, com o objectivo de requerem auxílio à Junta Suprema da província espanhola da Extremadura (sediada precisamente em Badajoz). Pouco demoraram estas conversações, pois logo no dia 20 a dita Junta decide nomear o Coronel D. Federico Moretti, segundo conta o próprio, "para entrar em Portugal com uns duzentos homens da Legião de Voluntários Estrangeiros do meu mando (que tinha formado naqueles dias em Badajoz com o objectivo de favorecer os portugueses que queriam, imitando-nos, sacudir o jugo francês); naquela mesma noite cheguei a Olivença, e no dia seguinte, 21 de Junho, fiz-me dono da praça de Juromenha" [Fonte: Contestacion del Brigadier Don Federico Moretti y Cascone, (en la parte que le toca) al Manifiesto del Teniente General D. Juan Carrafa, Cadiz, Imprenta de Don Jose Maria guerrero, 1812, p. 19].
D. Federico Moretti (que como vimos passara pelo Algarve e Alentejo com o exército espanhol encarregado de ocupar aquelas províncias), contudo, omite vários dados nesta passagem. Ao chegar a Olivença na noite do dia 20, Moretti encontrou-se com o Sargento mor das Milícias de Vila Viçosa, António Lobo Infante de Lacerda, que ali se tinha refugiado depois de ver que era infrutífera a resistência ao mencionado ataque das forças de Avril. Concordando que o número de soldados que dispunham eram bem inferiores ao dos franceses, concertaram então estes dois comandantes que seria mais viável ocuparem a praça-forte de Juromenha, que serviria de ponto de apoio para manobras posteriores. Esta operação foi executada sem problemas logo no dia seguinte, por cerca de duzentos espanhóis e vinte portugueses que tinham acompanhado o Sargento António Lobo, todos eles comandados por Moretti, que detinha a maior patente. Depois de terem aprisionado o Governador da praça, José Joaquim de Silveira (acusado de colaboracionista), estes homens arvoraram a bandeira portuguesa e aclamaram o Príncipe Regente. Moretti notificou então a Junta da Extremadura, que lhe respondeu com a carta acima transcrita. Moretti permanecerá em Juromenha até 18 de Julho (quando parte para Évora com um corpo mais reforçado, como adiante veremos), tendo entretanto enviado diversas cartas e proclamações às povoações portuguesas das redondezas, convidando-as a se reunirem à "causa comum" e a formarem Juntas de governo, ao mesmo tempo que procurava causar o maior dano possível aos franceses, mandando interceptar a sua correspondência e tomar-lhe o gado, vinho e outros víveres com que se abastecia.
Vista aérea da praça-forte de Juromenha, sobranceira ao Guadiana (cujo leito subiu bastante devido à construção da barragem do Alqueva).