O General em Chefe do Exército aos Portugueses!
Portugueses! Depois de seis meses de tranquilidade, íeis a ficar expostos a ver perturbada a paz neste Reino pela efervescência cada vez maior das tropas espanholas, que não entraram no vosso país, ao que parecia, senão como aliadas, mas cujo objecto era a desmembração de Portugal. Quando no primeiro de Fevereiro declarei, em nome do Imperador, que eu tomava posse do Governo de Portugal, por inteiro, começaram os espanhóis a mostrar para comigo alguma falta de inteligência. Os sucessos acontecidos em Espanha, a insurreição desenfreada de alguns distritos daquele Reino, induziram diferentes corpos de tropas espanholas à deserção; e desde então começou a haver razões provocativas e alguns meios de facto para com os meus soldados.
Contando decerto com o bom espírito dos habitantes do Porto, não tinha eu deixado naquela província mais que alguns espanhóis; e tinha enviado para governá-la um General de Divisão e alguns Oficiais que se destinavam a ser empregados nas Praças. Aquele valoroso General, o Corregedor mor, um Coronel de artilharia e vários outros Oficiais civis e militares, que julgavam poder viver sossegados à fé de um General espanhol, e no meio das suas tropas - que digo, portugueses! - esse General espanhol caiu na vileza de prender aqueles quatro ou cinco Oficiais que nele confiavam: Belestá é o seu nome! Caiu ele na vileza de consentir que Oficiais valorosos fossem maltratados pelos seus soldados rebeldes, sem se atrever a reprimi-los. Saiu ele de Portugal com as tropas que lhe foram confiadas para defender este país; nele não há de tornar a entrar.
O mesmo espírito que dirigiu o movimento do Porto se comunicou às tropas espanholas acantonadas em Lisboa, Setúbal e seus arredores. A tranquilidade estava para ser perturbada; e eu mesmo teria de pôr-me em defesa contra tropas que faziam parte do meu exército. Obrigado me vi a tomar o partido de desarmá-las: assim o fiz. Nada temam porém os espanhóis estabelecidos em Lisboa e em todo o Reino de Portugal, seja qual for o ofício ou emprego que exercerem. Não procederei a represálias, assim como o fizeram os feros habitantes de Badajoz, de Ciudad Rodrigo, etc., etc., havendo tido a barbárie de lançar em masmorras alguns desgraçados franceses, pais de família, estabelecidos entre eles havia 50 anos, e que os faziam gozar dos efeitos da sua indústria! Farei vigiar severamente sobre todos os indivíduos dessa nação; e aquele que tentar semear a turbulência entre vós, será logo punido, e exemplarmente.
Portugueses! Satisfeito estou até aqui do vosso bom espírito. Haveis sabido prezar o bem que se vos deve seguir da protecção de NAPOLEÃO o GRANDE: tendes em mim confiança. Continuai assim; eu vos dou minha palavra de livrar o vosso país de toda a invasão, de toda a desmembração. Se os ingleses, que só sabem fomentar a discórdia, quiserem agora vir procurar-nos, achar-nos-ão inteiramente prontos a defender-vos. Alguns dos vossos batalhões de milícias e os regimentos que ficam em Portugal farão parte do meu Exército, para defender as vossas fronteiras; instruir-se-ão na arte da guerra; e se eu for tão feliz que possa pôr em prática as lições que recebi de NAPOLEÃO, ensinar-vos-ei a vencer. Viva o Imperador!
Dado no palácio do Quartel-General em Lisboa, a 11 de Junho de 1808.
Assinado: O Duque de Abrantes
[Fontes: Copiámos o texto inserido no 2.º Suplemento à Gazeta de Lisboa, n.º 23, 11 de Junho de 1808; o edital digitalizado (contendo tanto a versão original, em francês, como uma outra tradução com variantes), encontra-se presente no Archivo Histórico Nacional de España, Correspondencia de Juan Betegón al general Domingo Belesta (Código de referência: ES.28079.AHN/1.1.32//ESTADO, 1750, Exp. 12)].