Tendo sido comissionado pelo Senhor Coronel D. Federico Moretti, Comandante das tropas espanholas na cidade de Évora, para levar ofícios desta Suprema Junta e do mencionado Senhor Comandante às Juntas de Coimbra e do Porto, e aos Generais português e inglês, parti no passado dia 26 de Julho, juntamente com quatro indivíduos da minha partida volante e um indivíduo da Legião de Voluntários Estrangeiros, dirigindo a minha marcha por Tancos, em direcção a Coimbra, em cujo primeiro ponto me vi cercado por uns 300 franceses de cavalaria e artilharia volante, que dirigiam a sua marcha a Abrantes; e ainda que o muito conhecimento que tinha dos caminhos me proporcionou pôr-me a salvo, fui perseguido durante três léguas por uma grande partida do inimigo, à distância de um tiro de canhão; devendo a nossa salvação a um bosque onde pudemos ocultarmo-nos.
Cheguei finalmente a Coimbra, e tendo-me apresentado ao General português que comandava as armas naquele ponto, entreguei-lhe os ofícios, suplicando-lhe que enviasse pelo correio os que iam dirigidos à Suprema Junta e ao General em Chefe do Porto, enquanto eu me avistava com o General inglês na Figueira; acedeu à minha petição o General português, e empreendi a minha marcha para a Figueira, que dista 7 léguas a ocidente de Coimbra, por caminho de serra.
À minha chegada apresentei-me ao General Wellesley, que o é em Chefe do Exército inglês, e que se achava acampado em Lavos, a uma légua ao sul da Figueira, o qual me recebeu com as maiores provas de júbilo e satisfação; informei-o de todos os sucessos da Espanha, servindo-me de tradutor o seu secretário; e concluída a sessão, fui lanchar com o dito General e o seu Estado-Maior.
Acabado o lanche, o General honrou-me levando-me ao seu lado a ver a revista das suas tropas, que tinham acabado de desembarcar naquele mesmo dia 7 de Agosto, e formavam um corpo de 7.000 homens e 4.000 cavalos, acompanhados por um magnífico parque de artilharia, cujo número não posso precisar por não ter podido contá-los exactamente, formando quase um exército os carros, carruagens e bagagens que o acompanham.
O dito General em Chefe disse-me que tinha estado em Ferrol com a sua esquadra, onde ofereceu a sua tropa à Junta Suprema daquele Reino [da Galiza]; mas que esta só aceitou 30.000 armas e cartucheiras e 2.000.000 de pesos fortes em dinheiro.
No dia 8 chegou uma nova esquadra inglesa proveniente de Cádis, trazendo a bordo os 5.000 homens de infantaria [comandados pelo General Spencer] que o General Castaños tinha recusado, os quais começaram a desembarcar no dia 9 pela manhã.
Antes de me retirar, comunicou-me o General inglês que ainda esperava 5.000 homens da Guarda Real da Inglaterra, e que uma vez reunidas essas forças empreenderia a sua marcha em direcção a Lisboa, procurando cortar a retirada ao resto dos franceses que tinham saído de Évora para Abrantes, e que tentarão atravessar o Tejo através de [Vila Nova da] Barquinha; tendo manifestado o dito General em Chefe a sua surpresa ao ver batido em Évora o Exército francês, formado por tropas escolhidas e em número de 8.000 homens, por 1.810 espanhóis; pedindo-me que assegurasse a Vossa Excelência que, tomando [os espanhóis] a esquerda[=sul] do Tejo (que se acha sem inimigos), ele respondia pela tomada da capital; e que a não render-se Junot à discrição, aos dez dias da sua intimação, seriam todos sem excepção passados à faca. Representei-lhe o dano que nos podia fazer a esquadra russa, e então, abraçando-me, disse-me: Esses já são nossos.
Saí no dito dia 9 para Coimbra, e o General português disse-me que tinha remetido as respostas à Suprema Junta de Évora, dando-me tanto este como o General em Chefe inglês os certificados competentes de ter entregado os ofícios e de ter executado a minha comissão com a maior exactidão.
O Exército português do Porto e de Coimbra compõe-se de 2.000 homens, todos vestidos e armados; pois os dois milhões de cruzados que devia dar a cidade do Porto de contribuição extraordinária foram utilizados para vestir a tropa, tendo contribuído voluntariamente todo o comércio e nobreza com donativos com o mesmo fim.
Quando regressei, pude apreender com a minha pequena partida, a 4 léguas de Abrantes e quase à vista da divisão francesa comandada pelo General Loison, 88 fardos de algodão fino, pesando cerca de 500 arrobas no total, os quais foram escoltados até à praça de Marvão, donde se mandou que passassem à de Campo-Maior, onde as que pus à disposição do referido Senhor Coronel D. Federico Moretti, debaixo de cujas ordens me encontrava [originalmente] em Évora; sendo este o resultado da expedição que executei por uma comissão particular.
Isto é tudo quanto devo dizer a Vossa Excelência em consequência do que mandou esta manhã.
Deus guarde a Vossa Excelência muitos anos.
Badajoz, 16 de Agosto de 1808.
Excelentíssimo Senhor Donato Gonzalez Cortes
[Fonte: Diario de Badajoz, n.º 63, 18 de agosto de 1808, pp. 265-267; Gazeta de Madrid, n.º 118, 30 de Agosto de 1808, pp. 1102-1103].