Depois de saber em Abrantes que toda a corte se preparava para partir de Lisboa, Junot ainda envia uma carta ao príncipe, esperando-o reter na medida do possível. Ao mesmo tempo, continua a avançar "a toda a velocidade", chegando a Santarém no dia 27, apesar de ter tido, segundo as suas palavras, "de marchar durante um dia inteiro dentro de água e, por vezes, até à cintura; as minhas tropas estavam estafadas; em Santarém, soube que estava tudo pronto para a partida". Já nada havia a fazer...
Continua ele: "Encontrei então o senhor [José de Oliveira] Barreto e, embora tivesse adivinhado muito bem o objecto da sua missão, fingi acreditar nele e reenviei-o imediatamente para Lisboa, pelo Tejo, com o senhor Hermann1; era minha única intenção que se soubesse que eu estava muito perto da cidade e que isso pudesse determinar o povo a impedir a saída da esquadra. [...] O senhor Hermann não pôde ver o Príncipe nem o senhor d'Araújo; este último apenas lhe mandou dizer que estava tudo perdido; entretanto, cheguei no dia 29 às 10 horas [da noite] a Sacavém, a 2 léguas de Lisboa, e tive de dar ali repouso às minhas tropas; de resto, não queria chegar a Lisboa de noite, no meio da desordem que a minha entrada faria aumentar. [...] Eu tinha recebido durante o dia muita gente, na sua maioria franco-maçons, que muito me serviram para fazer voltar a tranquilidade ao povo. Também recebi, da parte da chamada Regência, o senhor Tenente-General D'Albuquerque; vali-me dele para mandar dar as ordens que julguei necessárias às tropas portuguesas, que foram todas utilizadas para manter a tranquilidade na cidade, pela qual as tornei responsáveis, e para remontar as peças de canhão que defendiam o porto e que tinham sido viradas e, algumas delas, encravadas.
Mandei no mesmo dia imprimir e afixar em todas as ruas de Lisboa uma proclamação que segue em anexo [...]. Os espíritos estavam muito agitados, e os habitantes receavam pilhagens; o senhor Hermann escreveu-me uma longa carta, na qual me pareceu que ele tinha recomendado a alma a Deus e me encarregava de recomendar à bondade de Vossa Majestade a mulher e os filhos" (JUNOT, Diário da I Invasão Francesa, p. 101).
Na manhã desse mesmo dia 29 tinha havido um eclipse, segundo conta o General Foy2:
Sete dias antes tinha havido ainda um pequeno tremor de terra, segundo anotou Eusébio Gomes...
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1 Hermann, cônsul francês em Lisboa, encarregado de negócios da França em Portugal desde o abandono da embaixada por Junot, em 1805, será nomeado em Dezembro de presidente do Real Erário, com o título de administrador-geral das finanças (in arqnet).
2 Este curioso pormenor pode ser confirmado através do site da NASA, onde se pode determinar que o eclipse teve o seu pico máximo, na zona de Lisboa, por volta das 11 horas da manhã.