El Alcalde de Móstoles declara la Patria en peligro.
Quadro de Antonio Pérez Rubio, presente na Real Casa de Correos de Madrid.
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Senhores de Justiça das povoações a que se apresentar este ofício de mim, o Alcaide da vila de Móstoles:
É notório que os franceses postados nas vizinhanças de Madrid e dentro da Corte tomaram a defesa sobre esta capital e as tropas espanholas; de maneira que em Madrid está correndo a esta hora muito sangue; como espanhóis, é necessário que morramos pelo Rei e pela Pátria, armando-nos contra uns pérfidos que, sob pretexto de amizade e aliança, querem-nos impor um pesado jugo, depois de se terem apoderado da Augusta pessoa do Rei; procedamos pois a tomar as activas providências para escarmentar tanta perfídia, acudindo ao socorro de Madrid e demais povoações, e alentando-nos, pois não há forças que prevaleçam contra quem é leal e valente, como os espanhóis o são.
Deus Guarde a Vossas Mercedes muitos anos.
Móstoles, dois de Maio de mil oitocentos e oito.
Andrés Torrejón
Anton. Fernandéz
[Fonte: Lorenzo Peréz González, Carta de los Alcaldes de Móstoles (Dos de Mayo de 1808), Cumbres de San Bartolomé, Ayuntamento de Cumbres de San Bartolomé y Diputación Provincial de Huelva, 2008, pp. 31-38].
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Nota:
A notícia, logo exagerada, que os franceses tinham espalhado o terror em Madrid, na manhã de 2 de Maio de 1808, espalhou-se quase imediatamente por todo o oeste e sudoeste de Espanha (território não ocupado pelos franceses). O maior contributo para tal difusão parece ter sido dado precisamente pelo bando ou aviso acima traduzido, composto (ou somente assinado, segundo as versões) nessa mesma tarde de 2 de Maio pelas autoridades de Móstoles (vila situada a cerca de 25 quilómetros a sudoeste da capital espanhola). Nos três dias seguintes, este aviso percorreu mais de 600 quilómetros, facto que se depreende com certezas através daquela que durante muito tempo foi considerada como a única cópia conhecida deste documento, a qual inclui acrescentos das autoridades das povoações por onde o aviso ia passando, como por exemplo a seguinte nota, que antecedia a transcrição do aviso propriamente dito: A esta hora e nesta data acabo de receber o seguinte; o que à mesma hora do seu recibo se servirá V[ossa Mercê] de remeter a Cortegana e Aroche. Diz assim: A estas horas que são as quatro e um quarto da tarde, acaba de me ser entregue um ofício do Sr. Alcaide mor da vila de Fregenal que vem a toda a diligência referente ao que recebeu do Sr. Alcaide mor da vila de Fuente del Maestre, que lhe dirigiu o Sr. Alcaide mor Interino da cidade de Mérida relativo ao que por um mensageiro que veio a toda a diligência lhe comunicou outro da vila de Móstoles com data de dois do [mês] corrente que diz o seguinte...
Segundo estas e outras notas incluídas nessa cópia, o aviso teria feito o seguinte percurso em apenas três dias:
Para além das localidades assinaladas, sabe-se ainda, através de outras fontes, que este aviso chegou ainda no dia 3 de Maio ao conhecimento das autoridades de Trujillo (que por sua vez puseram em alarme as mais de 80 povoações da sua jurisdição). No dia 4, o aviso teria chegado a Badajoz, levando o Capitão-General da Extremadura a expedir no dia seguinte uma carta circular onde incentiva o alistamento de toda a província, ao mesmo tempo que enviava Frederico Moretti numa missão secreta a Portugal, a fim de tentar obter o apoio do General Juan Carrafa. Entretanto, o bando de Móstoles continuava a ser divulgado, passando por Córdoba, Sevilha, etc. Contudo, apesar de tantos quilómetros percorridos, as cópias deste documento perderam-se nos tempos, talvez devido aos avisos quase imediatos das autoridades de Madrid, que desmentiram a gravidade dos incidentes de 2 de Maio, numa tentativa, que surtiu efeito (ainda que temporário), de serenar os ânimos mais exaltados. Resulta curioso observar-se que logo a 13 de Outubro de 1808, as autoridades de Móstoles escreveram ao Corregedor de Talavera de la Reina pedindo uma cópia do aviso que tinham expedido, pois com a pressa de o enviarem para todas as partes, não se tinham lembrado de conservar a respectiva cópia. No entanto, em Talavera de la Reina também não se tinha guardado cópia alguma...
Aparentemente, tinha-se perdido o rasto do aviso original: entre as dezenas ou centenas de periódicos e escritos patriotas e políticos que foram publicados na Espanha entre 1808 e 1809, incluindo os sete tomos da Demostración de la lealtad española (a maior colecção de proclamações e avisos da época), não se encontra qualquer transcrição do aviso original de Móstoles. Este facto deu azo a que logo em 1810 fosse publicada a seguinte versão apócrifa, forjada nitidamente pela máquina propagandística patriota e anti-napoleónica:
A Pátria está em perigo; Madrid perece, vítima da perfídia francesa. Espanhóis, acudi todos a salvá-la.
2 de Maio de 1808.
O Alcaide de Móstoles
[Fonte: Alvaro Flórez Estrada, Introducción para la historia de la revolución de España, Londres, Imprenta de R. Juigné, 1810, p. 126].
Esta deturpação foi repetida em obras posteriores, e foi preciso esperar até à comemoração do centenário destes acontecimentos para que o texto original fosse resgatado do esquecimento. Entretanto, em 1886, o padre da povoação de Cumbres de San Bartolomé encontrara uma cópia do aviso original nos arquivos da sua paróquia, depositando-a pouco depois no arquivo municipal da mesma povoação. Tanto a nossa tradução como os dados acima indicados derivam precisamente desta cópia, que durante muito tempo se julgou que era a única ainda existente, embora hoje se saiba da existência de pelo menos outras tres cópias (uma das quais irremediavelmente perdida).
Consultar, ainda a este respeito: