Porto, 18 de Agosto de 1808
Senhor:
Como o Bispo do Porto manifestou-me que me queria ver em privado, a fim de me fazer uma importante comunicação, que desejava que se mantivesse secreta, fui ao seu Palácio na noite passada, a uma hora tardia. O Bispo disse-me então que tinha tomado o Governo de Portugal nas suas mãos, mas a sua intenção era restabelecer o Governo do seu legítimo Soberano, e esperava que Sua Majestade o Rei da Grã-Bretanha não tivesse outro objecto em mente quando enviou as suas tropas para este país. Depois de lhe ter dado todas as garantias sobre este assunto, o Bispo continuou: que como o Príncipe Regente, ao deixar Portugal, estabelecera uma Regência para governar este país durante a sua ausência, ele considerava que tinha o dever de abdicar do Governo e dispô-lo nas mãos da Regência, logo que fosse possível.
Respondi que não tinha instruções do meu Governo sobre este assunto, mas roguei-lhe para considerar se a causa do seu Soberano não se prejudicaria ao abdicar do Governo nas mãos da Regência, que, como tinha agido debaixo da influência dos franceses, tinha perdido a confiança da Nação; e se não seria mais aconselhável que ele continuasse a deter o Governo, até que a vontade do Príncipe Regente fosse conhecida.
O Bispo admitiu que a Regência nomeada pelo Príncipe Regente não possui a confiança do povo, que vários dos seus membros agiram de tal maneira que aparentam ser amigos e partidários dos franceses, e que, em todo o caso, nem todos os membros da antiga Regência podiam ser restabelecidos no seu poder anterior; contudo, ele teme que as províncias da Estremadura, Alentejo e Algarve não reconhecerão a sua autoridade, se o Governo britânico não interferir.
Depois de uma longa conversação, acordámos que eu deveria informar aos nossos Ministros aquilo que o Bispo me comunicou, e que, de forma a não se perder tempo à espera duma resposta, o Bispo quis que comunicasse o mesmo a vós, expressando a vontade de lhe escreverdes uma carta oficial, onde lhe referireis a vossa vontade em que ele detenha o Governo, até que a vontade do seu Soberano seja conhecida, para bem das operações das tropas britânicas e portuguesas debaixo do vosso comando.
O secretário do Bispo, que serviu de tradutor, disse-me depois, em privado, que rebentaria uma enorme confusão se o Bispo abdicasse do Governo neste momento, ou se se associasse com pessoas que nem são queridas nem estimadas pela nação.
Peço licença para acrescentar que, apesar do Bispo ter expressado o contrário, todavia parece-me que ele não se opõe a manter o Governo nas suas mãos, se tal pudesse ser feito pela interferência do nosso Governo.
Brigadeiro-General
[Fonte: Memoir, written by General Sir Hew Dalrymple, Bart., of his proceedings as connected with the affairs of Spain, and the commencement of the Peninsular War, London, Thomas and William Bone Strand., 1830, pp. 285-286].