sexta-feira, 27 de maio de 2011

Criação da Junta de Sevilha (27 de Maio de 1808)



A crise política espanhola (que não se tinha resolvido com a aclamação de D. Fernando VII) agravou-se com a notícia das abdicações de Bayonne. Segundo o professor Antonio Moliner Prada, 

A situação de anarquia crescente levou os patriotas a procurar uma saída nova para resolver a crise política, ao criar umas Juntas de autoridades em cidades e províncias que nem tinham existido antes, nem contavam com um marco jurídico para a sua formação, e que se estenderam também em Portugal e nas colónias hispano-americanas. Quem eram estes homens que estavam dispostas a enfrentar-se contra o invasor e a organizar-se para isso através das Juntas? 
Não se pode dissociar a formação das Juntas do levantamento popular, ainda que as novas instituições criadas sejam compostas na sua maioria por membros das elites locais e provinciais e não directamente pelo povo. A sociedade concebe-se segundo o imaginário do Antigo Regime, ou seja, o de estratos sociais, daí que todos eles estejam representados nas Juntas, recorrendo a instituições tradicionais como a Junta Geral do Principiado das Astúrias, as Cortes em Aragão e na Galiza.
As Juntas formaram-se à margem ou frente ao poder constituído, que já não existe ao estar ausente o rei. Neste sentido, produziu-se uma ruptura com as autoridades estabelecidos. Ao seguir a doutrina dos pactos, as Juntas eram agora as depositárias da soberania que emana do povo e que na conjuntura de 1808 devém nos seus membros que se constituíram em seu nome, aspecto profundamente inovador e revolucionário.
As 18 Juntas Supremas Provinciais que se constituíram [na Espanha] aparecem como novos poderes e autoproclamam-se soberanas, pelo poder que tinham recebido supostamente do povo, e, ao actuar em nome de Fernando VII, não reconheceram as abdicações de Bayonne, fruto da violência. Legitimaram-se dizendo que actuavam em representação da nação e de Fernando VII. Por isso encheram-se de títulos e honras, buscando a sua legitimidade ritual como no Antigo Regime, e em consequência actuaram com absoluta independência: organizaram a resistência e o exército, nomearam Generais e outros funcionários, estabeleceram impostos, administraram as rendas e iniciaram relações com outras nações e entre elas mesmas. O seu objectivo principal em cada território era estabelecer um plano de defesa para conservar a independência da nação.
As Juntas reconduziram a situação de vazio de poder que se tinha produzido em todos os lugares, daí que tenham dedicado grande parte dos seus esforços a velar pela ordem pública para reconduzir [contra os franceses] as explosões de violência que se tinham produzido [contra as próprias autoridades constituídas].



No dia 27 de Maio de 1808, era formada uma das primeiras Juntas espanholas, a autodenominada Junta Suprema de Governo (de Sevilha), composta pelas seguintes personalidades:


1. Presidente: Francisco Saavedra (antigo Secretário de Estado da Fazenda de Carlos IV).





Representantes do alto clero:

2. D. Juan Acisclo de Vera, Arcebispo de Laodiceia e co-administrador da diocese de Sevilha.

3. o Deão do Cabido de Sevilha
4. D. Francisco Xavier Cienfuegos, Cónego do mesmo Cabido



Representantes da Real Audiência:

5. D. Francisco Díaz Bermudo, Regente.
6. D. Juan Fernando Aguirre



Representantes da Nobreza:

7. Conde de Tylli
8. Marquês de Grañina
9. Marquês de las Torres
10. D. Andrés de Miñano y las Casas
11. D. Antonio Zambrana Carrillo de Albornoz



Representantes da cidade de Sevilha:


12. D. Andrés de Coca
13. D. Josef de Checa



Representantes dos Generais:


14. D. Eusebio Herrera.
15. D. Adrián Jacome.




Representantes do Cabido dos Jurados:

16. D. Antonio Zambrano
17. D. Manuel Peroso



Representante do povo:

18. D. Josef Morales Gallego



Representantes do comércio:

19. D. Victor Soret
20. D. Celedonio Alonso



Representantes da religião:


21. Padre Manuel Gil
22. Padre Josef Ramírez 




Secretários:

23. D. Juan Bautista Esteller (Primeiro secretário), Tenente do Terceiro Regimento de Artilharia
24. D. Juan Pardo (Segundo secretário), Ajudante do Regimento de Farnésio



Segundo a primeira proclamação que esta Junta mandou publicar, lavrada com a data de 28 de Maio, uma vez "eleitos", estes vinte e quatro membros "juntaram-se imediatamente para acordar o que convinha fazer em benefício da pátria e da defesa contra os seus inimigos; o que executaram na forma seguinte:

Que se despachem correios expressos ao Ex.mo Sr. Capitão Geral da província [da Andaluzia], conduzidos pelo sr. Conde de Teba [depois do Montijo], encarregado particularmente de instruir S. Ex.ª do que a Junta determinou e das suas intenções, e ao Ex.mo Sr. Comandante General do Campo de S. Roque; às cidades de Córdoba, Granada e Jaén, às províncias da Extremadura e a outras cidades e vilas mais próximas, com o objectivo de, instruídas da resolução desta capital, se esforcem e se reúnam para conseguir o desejado fim que a anima.
Que se componham e imprimam proclamações pelo sr. D. Fernando VII, e se façam circular a todas as povoações do reino desta cidade, e a todas as demais que sejam convenientes. 
Que continuem os senhores Regente e Ministros da Real Audiência e os demais juízes desta cidade nos seus respectivos exercícios, para que não se demore a administração da justiça.
Que o papel selado corra, por agora e enquanto se habilita outro carimbo, com o cabeçalho de Valha para o Reinado de Sua Majestade o Senhor D. Fernando VII.
Que se encerre o teatro cómico desta cidade, e se passe um ofício ao sr. Deão para que, fazendo-o presente ao Il.mo Cabido, disponha que se celebre uma oração sobre o acerto desta Junta nas suas disposições e na felicidade das tropas espanholas.
Que em tudo o que diz respeito às armas e ao exército disponham quanto estimem ser útil os senhores D. Antonio de Gregori e D. Tomas Moreno, seu segundo; tendo entendido que a Junta dá a cada soldado voluntário quatro reales e a sua ração de pão, e à demais tropa um real a mais sobre o seu soldo.
Que para recolher fundos e tudo o que diz respeito à Fazenda, nomeia os senhores D. Francisco Cienfuegos, D. Andres de Coca, e D. Victor Soret, e para Intendentes para a distribuição e disposição dos ditos fundos, os senhor D. Tomas Gonzalez Carbajal e D. Antonio Cabrera.
Que o ramo da polícia fica a cargo dos senhores alcaides de quartel e Tenentes, para que dêem sobre este ponto as providências que sejam convenientes, e à Junta prestem conta do que ocorra particularmente.
Que se comissiona os senhor D. Antonio Zambrano e D. Manuel Peroso para que, valendo-se das pessoas e meios que achem convenientes, cuidem do fornecimento do pão, para que não falte ao público em ocasião tão interessante.
Que se proíbe a todos os habitantes de qualquer estado ou condição que sejam o uso de armas, disparar nas ruas, causar alvoroços ou inquietações, prevenidos de que, fazendo o contrário, serão castigados com o rigor correspondente, proporcional ao seu excesso, e da menor desobediência ou omissão que prestem a esta Junta, cuja autoridade devem respeitar.
E para que chegue à notícia de todos se manda publicar e fixar.
Sevilha, vinte e oito de Maio de mil oitocentos e oito.
D. Juan Bautista Esteller, Secretário primeiro.
D. Juan Pardo, Secretário segundo.
[Fonte: Coleccion de Bandos, Proclamas y Decretos de la Junta Suprema de Sevilla, y otros papeles curiosos, Cádiz, Reimpresa por D. Manuel Santiago de Quintana, s.d. (1808?), pp. 3-5].