sexta-feira, 8 de abril de 2011

Publicação da sentença do processo de El Escorial


"Ao episódio do Motim de Aranjuez foram dados eufemisticamente muitos e variados nomes: tormenta, rebelião, revolta, traição, deploráveis jornadas, catástrofe, revolução, levantamento, alvoroço, agitação, sublevação, comoção ou sucessos de Aranjuez, e assim muitos mais, e ainda que numerosos historiadores de relevante prestígio se resistem a denominá-lo pelo seu nome, esta acção só tem um: golpe de Estado". Estas palavras de José Luis Lindo Martínez (in El Motín de Aranjuez, inicio de la Guerra de la Independencia. Una historia falseada) resumem o falseamento histórico de um episódio que durante dois séculos tem vindo a ser tantas vezes considerado como um levantamento popular contra os franceses, que teria iniciado a assim chamada Guerra de la Independencia.

No entanto, basta consultar as fontes da época para ver que os franceses eram nesta altura vistos como heróis, em grande parte devido à propaganda espalhada pelos próprios partidários de D. Fernando, que afirmavam que os exércitos napoleónicos tinham entrado na Espanha com o objectivo de derrubar Godoy. De facto, a revolução ocorrida entre 17 e 19 de Março de 1808 em Aranjuez foi realmente um golpe de estado urdido pela nobreza espanhola, que usou para seu próprio proveito a ambição de poder de D. Fernando e o descontentamento do povo, contra o poder intocável de Godoy, e que teve como pretexto a iminente partida da família real para o sul da Espanha, eventualmente para depois embarcar para as colónias americanas, imitando o exemplo da Corte portuguesa. 

Costuma-se dizer que a história é escrita pelos vencedores, e foram de facto os partidários de D. Fernando que começaram por viciar a história destes acontecimentos, através de uma explicação maniqueísta onde Godoy era visto como a causa de todos os males da Espanha e D. Fernando como o único salvador possível da pátria. Consumado e consagrado em Aranjuez, D. Fernando começou logo por contribuir para que se manchasse ainda mais a imagem de Godoy, ao mesmo tempo que limpava a sua. Assim, no dia 31 de Março, um número extraordinário da Gazeta de Madrid anunciava o que se segue, antes de inserir um resumo do processo do Escorial e da sua sentença: "Ainda não se publicou o resultado do processo realizado no Escorial, apesar do que se previne no decreto de [D. Carlos IV de] 30 de Outubro do ano passado; e desejando el-Rei Nosso Senhor [D. Fernando VII] que todos os vassalos se instruam dos procedimentos contra a sua Real pessoa, vários criados seus e outros sujeitos que intervieram nas ocorrências dela, mandou fazer um breve resumo do seu conteúdo, segundo a sentença dele, achada nos papéis do Príncipe da Paz". 

Recordemos que este processo tinha chegado ao fim no dia 25 de Janeiro, embora entretanto não se tivesse publicado a sua sentença. No dia 8 de Abril, reimprimia-se o decreto de D. Carlos IV de 30 de Outubro de 1807 (onde anunciava o processo no qual o seu filho estava imputado), uma ordem de 3 de Novembro seguinte (para ser realizada uma missa de acção de graças pelo fiasco da conspiração contra Carlos IV), e finalmente o resumo do processo e a sentença (que tinha sido publicada no referido n.º extraordinário da Gazeta de Madrid de 31 de Março de 1808), para ser posta a circular entre a magistratura de Espanha: 










[Fonte: Archivo Histórico Nacional de España, 
ES.28079.AHN/1.1.38.1//CONSEJOS, L.1398, Exp. 100]