No dia 15 de Fevereiro, Junot recebe a seguinte carta de Napoleão:
Paris, 29 de Fevereiro de 1808
Recebi a vossa carta de 14 de Fevereiro. Tascher ainda não chegou; ele chegará, sem dúvida, amanhã ou depois; suponho que ele não tardará. Vejo com prazer que desarmastes a cidade de Lisboa e o país, e que acelerastes o envio das tropas portuguesas para a França; mas vejo com pena que não tendes outro meio de incendiar a cidade e de a reduzir, se ela se revoltar, senão com as vossas baterias costeiras; e isso é um pobre e triste recurso. É preciso uma boa cidadela que, por pouco forte que seja, possa, com uma guarnição de 400 a 500 homens, ser inexpugnável pela populaça. Ela deve conter morteiros e víveres. A notícia do estabelecimento dessa cidadela dar-me-á a confiança e a segurança necessárias.
Não há dúvida que deveis ter em Lisboa um grande estado. Autorizei pôr à vossa disposição, para despesas de representação e despesas secretas, 50.000 francos por mês e uma outra soma de 5.000 francos por mês para ser aplicada em tratamentos extraordinários, despesas secretas, etc., aos generais, comandantes de praças e oficiais encarregados de missões. Por este meio, tereis o suficiente para satisfazer os vossos desejos.
[Fonte: Lettres Inédites de Napoléon Ier (An VIII - 1815) - Tome Premier, Paris, Librairie Plon, 1897 (deuxième édition), pp. 157-158].
Junot responde a esta carta no dia 16 de Março. Para além de lhe agradecer pela quantia posta à sua disposição, Junot acrescenta o seguinte:
[...] Nesta carta, Vossa Majestade parece ignorar que eu mandei armar, logo que aqui cheguei, uma cidadela de Lisboa; mas, Sire, aquilo a que eu chamei castelo é uma excelente citadela na qual há 800 homens e uma boa artilharia; ainda lá se trabalha para colocar obuses e morteiros em posição vantajosa; ordenei que fosse lá instalada uma sala de armas para a qual mandarei transportar as espingardas que estão no arsenal de terra e as resultantes do desarmamento dos Regimentos de milícia; há lá mantimentos e biscoito, e posso assegurar que nem toda a cidade de Lisboa reunida a forçaria.
As tropas portuguesas iniciaram o seu movimento, mas não é possível fazer uma ideia justa das dificuldades que há em fazer mover-se um regimento português quando se lhe manda sair da sua guarnição; cada regimento é recrutado na província cujo nome tem; na sua grande maioria, os soldados são casados, e muitos deles só comparecem à chamada para as revistas, que são feitas sem exactidão; nesta altura, em que terão de sair do país, a deserção será extremamente considerável; quando tiveram de recuar para o Rossilhão com os espanhóis, tiveram mais de um quarto de deserções, e no entanto vinham embarcados; se viessem por terra, teria sido metade; mas Vossa Majestade supõe que eu não consigo cumprir mais depressa por uma condenável negligência ou indolência. Suplico-vos que não tenhais essa ideia; eu faço o que se pode fazer num país onde a natureza das coisas e dos habitantes se opões constantemente a qualquer acção e onde encontramos sempre contra nós a oposição de uma inércia pior que a má vontade deliberada. [...]
[Fonte: Junot, Diário da I Invasão Francesa, Lisboa, Livros Horizonte, 2008, pp. 152-153 (n.º 100)].