domingo, 10 de julho de 2011

Notícias de Ayamonte sobre os acontecimentos em Portugal (10 de Julho de 1808)



Ayamonte, 10 de Julho. 

O Algarve, livre já de piratas, não somente se acha, como que por encanto, num respeitável estado de defesa de tropas organizadas, como também destacou outras para o Alentejo, onde, segundo nos dizem de Évora, permanece ainda um curto número de Cavalaria francesa. Estes descobriram um aprovisionamento onde os portugueses tinham escondido 400 arrobas de pólvora, que inutilizaram atirando-a num lago. 
Por um correio que enviou para aqui a Junta de Mértola, novamente erigida pelo Corregedor de Beja, com a data de 7 de Julho, diz-se o seguinte: "Dou a Vossas Senhorias a agradável notícia que às dez da manhã se acaba de receber um correio do General Gomes Freire, no qual manda dizer que no dia 30 de Junho chegou a Santarém (a nove léguas de Lisboa) com 30 mil homens. Os franceses, que acometeram contra Beja, passaram a Setúbal, tendo tomado a artilharia de Montemor". 
Ontem recebeu-se a notícia de que Lisboa estava já em insurreição; e que os nossos espanhóis faziam ali prodígios de tal valor que forçaram os franceses a encerrarem-se no Castelo de S. Filipe [em Setúbal]. 
O General francês Maurin e o ingrato Malet*, prisioneiros em Faro, a quem se lhes propôs que escolhessem o destino entre as praças de Espanha ou da Inglaterra, determinaram que iriam para Gibraltar, onde se acham já, como escreveu o General do Algarve. 


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Nota:

Parece-nos que este "Malet" seria o "João Baptista Malé" (ou Jean-Baptiste Malet?) reportado pelo padre João Coelho de Carvalho, na sua Memória da Revolução do Algarve. De facto, o citado autor conta a este respeito que o General Maurin foi aprisionado em Faro (a 19 de Junho de 1808) juntamente "com João Baptista Malé, seu ajudante, e um capitão do dito General e também ajudante dele. [Maurin] pediu que o levassem para casa do Excelentíssimo Bispo, que de boa vontade o aceitou, e em seu palácio esteve alguns dias debaixo da mais rigorosa prisão, sendo a Nobreza quem de dia e de noite o vigiava com sentinelas à vista. O Governo, que então já estava organizado, não pôde vencer os clamores do povo, que queria ver fora do país o General e toda a tropa francesa, ordenou que com outros oficiais fosse conduzido para Sagres, onde não chegou, por ser preciso contramandar a ordem, visto que o povo não se aquietou com isto, querendo-o fora do Reino; e também porque o povo de Lagos se amotinou logo que ali chegou a embarcação que os conduzia, custando a sustê-lo para que não o assassinassem. Foi ele e os demais conduzido portanto conduzidos para Gibraltar, onde os ingleses tomaram posse dele. Por aqui se pode ver a brutalidade destes povos, em se quererem privar de um prisioneiro que podia servir de refém. Também foram remetidos para Espanha os soldados franceses aprisionados, que ali foram postos em liberdade cuidando pouco a Espanha de prisioneiros portugueses. Parece incrível que não só a plebe instasse ao Governo por um tal procedimento, mas que pessoas caracterizadas e que deviam ter juízo fossem as que o maquinavam. O Governo conhecia a louca petição de um povo amotinado mas era preciso curar um mal com uma imprudência".