Sobral [de Monte Agraço], 1 de Setembro de 1808.
Meu caro Senhor:
Creio que na última carta que vos escrevi informei-vos das nossas acções dos dias 17 e 21 de Agosto; e que o Comandante em Chefe [Dalrymple] tinha acordado uma suspensão de hostilidades com os franceses, a fim de ser negociada uma Convenção para a sua retirada completa de Portugal.
Depois de ter escrito tal carta, recebi a vossa, segundo penso, no dia 19 de Agosto, que dei a Sir Hew Dalrymple, e ele certamente ter-vos-á escrito. Somente vos incomodo agora porque a partida de Sir Robert Wilson oferece uma oportunidade favorável para enviar uma carta, e porque considero que é desejável que sejais informado do estado das circunstâncias aqui.
O acordo para a suspensão de hostilidades, concluído na noite de 22 de Agosto, culminou com uma Convenção para a evacuação de Portugal pelos franceses, assinada no dia 30 daquele mês. Tanto quanto fui informado, a Convenção não contém nada de grande importância, exceptuando que os franceses serão levados para um porto na França; que até embarcarem ficarão em posse de Lisboa, e de duas léguas à sua volta; e que devemos ter o forte de São Julião, em Cascais, e todos os fortes da costa e no interior, depois da ratificação da Convenção.
Eles libertarão os prisioneiros espanhóis perante o comprometimento do General [Dalrymple] em usar os seus bons ofícios para que sejam igualmente libertados os franceses que foram aprisionados na Espanha, e que não se tenham envolvido em hostilidades.
Segundo fui informado, não existe nada mais na Convenção que tenha qualquer importância. Os russos, dinamarqueses, etc., ficam à nossa mercê.
Por aquilo que pude conhecer destes acordos, tenho muitas objecção tanto em relação ao Acordo para a suspensão de hostilidade como à Convenção para a evacuação de Portugal pelos franceses. Aprovo, contudo, o principal ponto da última, a saber, que se permita a sua evacuação; e é inútil incomodar-vos com as minhas objecções sobre o modo como se decidiu executar tal ponto.
As razões que tenho para pensar que fizemos o que era certo ao permitirmos a sua evacuação são as seguintes:
Primeira: Sir Harry Burrard e Sir Hew Dalrymple, ao determinarem que levariam o corpo de Sir John Moore para Lisboa, em vez de o colocarem numa posição onde teria meios para cortar a retirada do inimigo através do Tejo, permitiram que o inimigo se pudesse defender em Elvas e Almeida, e a campanha teria sido gasta no cerco ou bloqueio de tais praças. Admitindo que o exército que evacuará Lisboa passaria imediatamente às fronteiras da Espanha, concebo que era melhor ter tal exército nessa posição, e o nosso exército agindo na Espanha, em cooperação com as tropas espanholas, do que ter as tropas francesas ocupando praças-fortes em Portugal, e o nosso exército ocupado com o seu cerco ou bloqueio.
Segunda: O Comandante em Chefe [Dalrymple] e aqueles que o rodeiam pareceram muito relutantes em avançar para Lisboa, mesmo depois da nossa vitória de 21 de Agosto, sem a assistência do corpo de Sir John Moore; e como era muito incerto o momento da sua chegada à Maceira [=praia do Porto Novo], que era o lugar de desembarque, e como os atrasos nesta estação do ano eram muito perigosos, e já tinha havido bastante mau tempo no dia 22 de Agosto, que se esperava que se prolongasse no início deste mês, tendo que abandonar a costa a frota de transportes, cuja comunicação nos era também tão necessária naqueles dias, considerei que a única chance de alcançar Lisboa seria através duma negociação.
Se não tivéssemos negociado, não poderíamos ter avançado antes do dia 30, pois o corpo de Sir John Moore somente ficou pronto naquele dia. Os franceses teriam ao mesmo tempo fortificado as suas posições perto de Lisboa, o que possivelmente impediria que estivéssemos em situação de atacá-los antes do fim da primeira semana deste mês. Assim, tendo em conta a hipótese do mau tempo nos privar de comunicarmos com a frota de transportes e provisões, atrasando e tornando mais difíceis e precárias as nossas operações terrestres, que depois de tudo acabariam por não conseguir cortar a retirada dos franceses através do Tejo para o Alentejo, fui claramente da opinião que a melhor coisa a fazer era consentir uma Convenção e permitir que evacuassem Portugal.
Os detalhes desta Convenção, bem como os do acordo para suspensão de hostilidades, são questões doutro tipo, sobre as quais escuso de vos incomodar; e escrevi o que acima ficou escrito apenas para que estejais consciente das bases gerais pelas quais aquiescei com a Convenção, em virtude do seu ponto principal, parte do qual, segundo penso, induziu o próprio General [Dalrymple] a consenti-la.
Não sei o que é que Sir Hew Dalrymple está disposto a fazer, ou como foi instruído, mas se eu estivesse na sua posição teria 20.000 homens em Madrid dentro de menos de um mês.
Tenciono recomendar-lhe a armar e a vestir as tropas espanholas, e a enviá-las para a Espanha.
Nós, ou seja, o meu corpo, estamos apenas a vinte e quatro milhas de Lisboa, e creio que o exército está à mesma existência, no lado de Mafra.
Acreditai em mim, etc.,
Arthur Wellesley
[Fonte: Lieut. Colonel Gurwood (org.), The Dispatches of Field Marshal the Duke of Wellington, K. G. during his various campaigns in India, Denmark, Portugal, Spain, the Low Countries, and France, from 1799 to 1818 – Volume Fourth, London, John Murray, 1835, pp. 119-121].